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Você se lembra dos mecanismos da coagulação?

Você se lembra dos mecanismos da coagulação?
Lara Gandolfo
dez. 1 - 13 min de leitura
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Se você entrou agora na faculdade, prepare-se! Esse assunto pode causar alguns traumas (kkk), mas é importantíssimo para a sua formação.

Já é veterano ou está formado? Sempre é bom dar uma relembradinha!

O que é Hemostasia?

O sangue, cuja função é de transporte, precisa estar no estado líquido. Quando ocorre alguma lesão no endotélio vascular, neste local o sangue deverá tornar-se sólido, o chamado tampão hemostático.

O tampão hemostático tem função de cessar a hemorragia e também de realizar o reparo tecidual, para assim evitar uma perda excessiva de sangue, e evitar que ocorra a formação de trombos por excesso de fibrina. Logo em seguida, esse tampão deve ser removido, para que a luz do vaso seja pérvia e o fluxo sanguíneo retorne à normalidade.

Caso esse tampão fique no local, o fluxo sanguíneo torna-se turbilhonado, gerando movimentos de choques contra as células, ativando os fatores de coagulação e gerando um risco de oclusão da luz do vaso.

Então o que é hemostasia?

A hemostasia contém todos esses aparatos de resposta à lesão vascular, para que o sangue retorne à condição líquida, e o tampão deve ser removido.

Os eventos que constituem a hemostasia são:

-Constrição Vascular: o musculo liso vascular contrai para que diminua o fluxo sanguíneo. Impulsos nervosos dolorosos podem proporcionar esse estímulo (Isso acontece quando cortamos o dedo por exemplo)

-Formação do tampão plaquetário: no local da lesão, a plaqueta entra em contato com o colágeno vascular e com o Fator de von Willembrand (FVW), que promovem a agregação das plaquetas, formando o tampão plaquetário, que também pode ser chamado de TROMBO BRANCO. A superfície do endotélio vascular irá secretar tromboxano A2 e ADP, que serão responsáveis pela ativação plaquetária. No tampão plaquetário, há filamentos de fibrina, para torna-lo compacto.

*é como se fosse assim: quanto mais plaquetas passam por ali, mais plaquetas se unem! Uma vai atraindo a outraà um mecanismo de retroalimentação positiva!

*É tanta plaqueta se unindo no local da lesão, ocorre um mecanismo de FLIP-FLOP, que expõe na superfície da célula, um aparato para que se desenvolva a CASCATA DE COAGULAÇÃOà as plaquetas liberam substancias para que os fatores da coagulação se liguem e interajam, até que a trombina se forme. *a trombina ativa mais e mais plaquetas!!!

*Depois de ativadas, as plaquetas exibem receptores (GP IIb/IIIa) para FIBRINOGÊNIO e para o FVW. Ambos irão estimular a agregação plaquetária.

-Formação do coágulo sanguíneo: o coágulo começa a se formar entre 15-20 segundos se a lesão for grave, e em até 2 minutos se pequena.

No local da lesão, a parede vascular lesada, as plaquetas e as proteínas sanguíneas, se aderem ao local lesado e iniciam a coagulação.

A coagulação ocorre em TRÊS ETAPAS:

-1: a lesão do vaso estimula uma cascata de reações químicas com a participação dos fatores de coagulação. O resultado é a formação do complexo de substancias ativas, denominadas de Ativador da Protrombina.

-2: o ativador da protrombina converte a protrombina em trombina

-3: a trombina atuará como enzima e converterá o fibrinogênio em FIBRAS DE FIBRINA, formando um emaranhado de plaquetas, células sanguíneas e plasma para formar o coágulo.

Ao longo do texto irei descrever mais sobre o mecanismo da coagulação.

-Crescimento do tecido fibroso no local do coágulo, que feche o local do trauma, e dissolução do coágulo sanguíneo: Na última etapa da hemostasia, o coágulo pode seguir duas viasà a primeira: ele poderá ser invadido por fibroblastos para que se forme um tecido conjuntivo sob ele; ou uma segunda viaà que a dissolução do mesmo;

Quando o orifício da lesão é pequeno, ocorre a via de formação de tecido conjuntivo. São as plaquetas quem liberam o fator de crescimento para que o fibroblasto se estabeleça por lá. Em até duas semanas, haverá um tecido fibroso sob o local.

Porém, quando uma quantia muito grande de sangue extravasou para os tecidos, não é preciso que fiquem coágulos teciduais, e assim, as enzimas irão dissolvê-lo.

Hemostasia Primária

De forma geral, o objetivo da hemostasia primária é estancar o sangue, com a formação do tampão plaquetário. E geralmente ocorre na microcirculação.

Como já citado, o endotélio do vaso, possui propriedades intrínsecas para que não ocorra a agregação plaquetária (são substancias trombo-reguladoras que inibem as plaquetas; essas substâncias são: óxido nítrico, prostaciclinas e difosfatase ectoadenosina).

No momento em que ocorre a lesão no vaso, esses mecanismos anticoagulantes do endotélio, se perdem e aí ocorre uma série de eventos, que farão com que ocorra a formação do tampão plaquetário- aquele trombo branco que citamos no início do texto!

Obs: a hemostasia primária é representada pelas Plaquetas

Portanto, na hemostasia primária ocorre: contração vascular, ativação e agregação plaquetária, e formação do trombo branco.

As alterações da hemostasia primária normalmente cursam com púrpuras.

 

Mecanismos de coagulação - Hemostasia Secundária

A coagulação ocorre através de várias reações, sendo a formação da trombina a partir da protrombina, a principal delas.

A hemostasia secundária é o mecanismo de coagulação propriamente dito. E o objetivo principal, é evitar o ressangramento.

As alterações cursam com coagulopatias, e os hematomas são frequentes.

ALERTA SPOILER: Logo mais iremos falar das vias extrínseca e intrínseca da coagulação..., Mas, já adianto! As duas vias confluem para uma via em comum, formando o fator X, o responsável pela conversão da protrombina em trombina. E elas são responsáveis pela coagulação;

E qual é a função da trombina?

Ela é responsável pela conversão do fibrinogênio em fibrina.

Agora sim, vamos falar das vias da coagulação: extrínseca e intrínseca. Porém, sabe-se que essa divisão é meramente didática, pois esta não ocorre fisiologicamente em nosso organismo. (Mas guardem a fibrina que se formou ali em??)

A Cascata de coagulação é formada pelas vias extrínseca e intrínseca! E estas constituem a hemostasia secundária.

 

Via Extrínseca

Envolve componentes sanguíneos extravasculares.

Essa via será ativada quando houver TRAUMA na parede do vaso ou em tecidos extravasculares

No TRAUMA há a LIBERAÇÃO DO FATOR TECIDUAL (FT), que pode ser chamado de TROMBOPLASTINA TECIDUAL -> o FT se combina com o fator VII, que junto com o CÁLCIO -> ativam o fator X (o fator X ativado pode ser representado por Xa) -> o fator Xa irá se combinar com os fosfolipídios da membrana que fora lesada, e também com o Fator V ->  fator Xa + fator V  geram o complexo Ativador da Protrombina, que na presença do cálcio, ocorrerá a transformação da protrombina em trombina.

A ativação da via extrínseca ocorre através do fator VII, pertencente a via intrínseca.

 

Via Intrínseca

Envolve componentes sanguíneos intravasculares.

Quando o sangue entra em contato com essa superfície lesada e também a presença da pré-calicreína e cininogênio, ocorre a ativação do fator XII (ativação por contato). E assim inicia-se a cascata da via intrínseca.

Fator XIIa-> ativará o fator XI -> Fator XIa -> ativa o fator IX -> Fator IXa + fator VIIIa (foi ativado pela trombina e pelo cálcio) e irão ativar o fator X que irá converter o fator II (protrombina) em trombina.

A trombina formada irá converter o fibrinogênio em fibrina (aquela mesma que eu pedi para vocês guardarem).

 

Visão global da cascata de coagulação

Fonte: FRANCO, Rendrik F. Fisiologia da coagulação, anticoagulação e fibrinólise. Medicina (Ribeirão Preto. Online), v. 34, n. 3/4, p. 229-237, 2001.

O fibrinogênio é formado no fígado e é essencial para a coagulação. A trombina irá transformá-lo em fibrina, responsável por dar força ao coágulo. A malha de fibrina possui fibras multidirecionais, e impede o extravasamento sanguíneo, pois ela converte o tampão plaquetário em tampão hemostático.

Após todo o processo de coagulação, deverá ocorrer a fibrinólise. É um equilíbrio entre interromper a hemorragia (essa função é da coagulação) e remover a fibrina em excesso para que o sangue flua normalmente (função da fibrinólise).

Dessa forma, o lúmen do vaso fica pérvio novamente, pois o excesso de rede de fibrina fora removido.

 

Fibrinólise: também pode ser chamada de hemostasia terciária

No plasma sanguíneo há o plasminogênio, que se torna ativado pelo ativador do plasminogênio tecidual e passa a se chamar plasmina, uma enzima proteolítica. A plasmina irá degradas as fibras de fibrina e outras proteínas envolvidas na coagulação, como: fibrinogênio, fator V, VIII, protrombina e fator XII.

Neste momento, o fígado entra em ação novamente! A degradação que a plasmina faz sob a fibra de fibrina, gera produtos de degradação de fibrina (PDFs), que serão removidos pelo Sistema Retículo Endotelial, formado pelo fígado e baço principalmente.

 

Pontos importantes da coagulação:

As plaquetas são fragmentos anucleados, pequenas, e oriundas dos megacariócitos. O tempo de meia vida delas é de aproximadamente 7 dias.

Sem o CÁLCIO, a coagulação não ocorre.

A vitamina K, lipossolúvel, é proveniente da nossa dieta, e é absorvida pelo trato gastrointestinal mediante ingesta, e também é produzida de forma endógena, pela nossa flora bacteriana intestinal. O local da absorção dela é no íleo, mediante presença de bile.

Fatores dependentes da vitamina K: II, VII, IX e X
*temos um macetinho para gravar: II +VII = IX, parabéns X

 

FÍGADO: ele é fundamental para a coagulação, pois é nele que ocorre a produção dos fatores da coagulação (todos, exceto o FVW e o Fator VIII), além de proteínas anticoagulantes (proteínas C e S) e proteínas fibrinolíticas. Portanto, se o paciente possuir comorbidade hepática, como a cirrose, ele pode vir a desenvolver desordens na coagulação.  

COMPOSIÇÃO DO SISTEMA HEMOSTÁTICO: plaquetas, vasos sanguíneos (normalmente possuem substâncias anticoagulantes na superfície endotelial), proteínas coagulantes, anticoagulantes naturais, e o sistema fibrinolítico.

A coagulação consiste em um processo de equilíbrio de forças: em um lado há a força PRÓ-COAGULANTE, formada pelos fatores da coagulação (II, VII, IX e X); e no outro, a força ANTICOAGULANTE (proteína C e S). Todas essas forças são dependentes da Vitamina K.

ATENÇÃO: em nossa anamnese, deveremos investigar distúrbios, condições médicas pregressa e cirurgias que envolvam o íleo, pois alterações na vitamina K, poderão cursar com alterações na coagulação.

Ao exame físico, quando forem observados inúmeros hematomas, sem que o paciente saiba explica-los, é preciso investigar deficiência plaquetária, pois os tampões plaquetários não estão sendo formados de forma efetiva.

Para que ocorra de forma fisiológica, a hemostasia depende de alguns mecanismos, como:

  • Endotélio do vaso
  • Plaquetas
  • Sistema de Coagulação
  • Fibrinólise

Portanto.... qualquer um desses mecanismos alterados, pode culminar em alterações hemorrágicas e trombóticas.

Pronto, agora vamos conversar sobre as alterações que podem ocorrer na hemostasia!

 

Distúrbios da Hemostasia

  • Alterações congênitas: hemofilia, doença de von Willenbrand
  • Alterações adquiridas: politransfusão, drogas (heparina, cumarínicos), doença hepática, Coagulação Intravascular Disseminada
  • Distúrbios na coagulação
  • Anormalidades na função e número das plaquetas
  • Alteração na fibrinólise
  • Distúrbios na hemostasia primária

Os distúrbios na hemostasia podem ocorrer em qualquer uma das etapas! Por isso, a avaliação deve ser global.

Falando em avaliação...

Avaliação da Hemostasia

Como sempre, a anamnese e o exame físico, são imprescindíveis, para a realização de um bom diagnóstico.

Devemos questionar o paciente sobre:

  • O(a) Senhor(a), percebeu sangramentos anormais? Como por exemplo: Sangramento pelo nariz (epistaxe), manchas arroxeadas/avermelhadas (hematomas) espontâneos, sangramento pela gengiva, urina (hematúria), ou menstruação excessiva (polimenorreia)
  • Faz uso de algum medicamento (investigue sobre o uso de anticoagulantes e anti-agregantes)
    *não se esqueça de anotar a posologia do medicamento!
    *Uma dica que sempre ouço dos meus professores é que: o paciente que usa a mesma medicação por longo período de tempo, acaba esquecendo de dizer que a usa. Então faça perguntas abertas como: Toma algum comprimidinho todos os dias?
  • Avaliar o antecedente cirúrgico do paciente: questione se houve um sangramento excessivo, dificuldade para cicatrizar ou outra situação.
  • A função renal deve ser avaliada
  • Na ectoscopia: avaliar os hematomas, e questionar se aparecem espontaneamente e se são comuns de aparecer.

Exames Laboratoriais

Devemos sempre direcionar a solicitação de exames, pois não precisamos submeter o paciente a exames excessivos e muitas vezes caros. Além disso, não há necessidade de onerar o sistema.

Portanto, direcione os exames de acordo com sua suspeita clínica!


Para investigarmos a funcionalidade da hemostasia primária, podemos solicitar:

  • Contagem de plaquetas (vem no hemograma)
  • Tempo de Hemorragia
  • Analisador da Função plaquetária
  • Tromboelastografia
     

Na avaliação da coagulação, podemos solicitar:

  • Tempo de Tromboplastina Parcial (TTP) e TTPa (ativado)- avaliação da via extrínseca
  • Tempo de Coagulação ativado (TCA)
  • Tempo de Protrombina (TP)- avaliação da via extrínseca
  • Tempo de Trombina (TT)
  • Dosagem dos PDFs
  • Dosagem do Fibrinogênio

Para a avaliação da fibrinólise, ainda não existem testes laboratoriais.

E ai pessoal, ficou mais claro? Conta pra gente ai nos comentários! 

 

Referências

  1. USP. Clínica Médica. Doenças Hematológicas Oncologia Doenças Renais e Geniturinárias. 2009;3
  2. GUYTON, Arthur Clifton. Tratado de fisiologia médica. Elsevier Brasil, 2006.
  3. NUNES, Telma Ferreira. Distúrbios da Hemostase no Doente Cirrótico. 2014.
  4. Franco RF. Fisiologia da coagulação, anticoagulação e fibrinólise. Medicina (Ribeirao Preto) [Internet]. 30 de dezembro de 2001 [citado 1 de dezembro de 2020];34(3/4):229-37. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rmrp/article/view/3998
  5. CAGNOLATI, D. et al. Hemostasia e distúrbios da coagulação. Ribeirão Preto-SP, p. 49-55, 2015.

 


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