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O canário na mina que não cantou! O papel dos assintomáticos ou pouco sintomáticos na transmissão de COVID-19

O canário na mina que não cantou! O papel dos assintomáticos ou pouco sintomáticos na transmissão de COVID-19
Bruno Scarpellini
mar. 18 - 6 min de leitura
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Antigamente, lá pelos idos de 1890, os mineradores das minas de carvão usavam canários em gaiolas para checar a existência de gases tóxicos. Basicamente, se o canário morresse, era hora de sair correndo da mina. O canário é particularmente sensível aos gases tóxicos como o monóxido de carbono que, para nós, é totalmente invisível e sem odor. Esse tipo de gás se formava com muita facilidade depois de explosões dentro das minas, o que acontecia com frequência. E cada vez que isso acontecia, um dos mineradores descia na frente segurando a gaiola com o canário e – qualquer sinal de estresse no pássaro – ele dava meia volta e alertava todo mundo para evacuar a área.

Utilizo essa situação para relacionar com a atual pandemia do COVID-19.

Nos últimos 3 meses temos observado abismados a evolução da pandemia no mundo. Muitos, através do site em tempo real da Johns Hopkins. No último domingo, me lembrei do jogo de tabuleiro War (popular nos anos 80). Olhando o mapa da epidemia, é como se o jogador tivesse como objetivo da carta: “Conquistar o mundo!”. Confesso que ao ver o mapa é a sensação que tenho.

Mas o que pode ter dado errado no Brasil? O Carnaval? As temperaturas quentes? O nosso positivismo?

O segredo estava no canário da mina.

Enquanto ficávamos impressionados com a velocidade de crescimento da incidência do vírus e a capacidade dos chineses de disciplina de isolamento social e de construção de hospitais; esquecemos do canário da mina.

Já se sabe hoje que além de alto poder de transmissibilidade (R0 de 2-3) e seu crescimento exponencial (a cada 7 dias, em média, o número de casos novos se multiplica por 10), boa parte da cadeia de transmissão se deve aos assintomáticos e pouco sintomáticos (canários da mina). A NEJM (March 5, 2020 N Engl J Med 2020; 382:970-971 DOI: 10.1056/NEJMc2001468) havia publicado um relato de caso de uma chinesa assintomática que viajou a Alemanha a partir de Shangai (seus pais eram de Wuhan) e propagou o vírus em uma cidade alemã na ausência de sintomas.

Recentemente, o CDC estudou um cluster de casos em Boston que se originou dentro de uma conferência de uma empresa e que o caso índice era assintomático.

Além disso, a conceituada revista Science publicou um artigo mostrando a importância de A estimativa da prevalência e contagiosidade de novas infecções por coronavírus não documentadas (SARS-CoV2) é crítica para a compreensão da prevalência geral e do potencial pandêmico dessa doença. No estudo usaram observações da infecção relatada na China, em conjunto com dados de mobilidade, um modelo de metapopulação dinâmica em rede e inferência bayesiana, para inferir características epidemiológicas críticas associadas ao SARS-CoV2, incluindo a fração de infecções não documentadas e sua contagiosidade. Estimamos que 86% de todas as infecções não foram documentadas (IC 95%: [82% –90%]) antes das restrições de viagem em 23 de janeiro de 2020. Por pessoa, a taxa de transmissão de infecções não documentadas foi de 55% das infecções documentadas ([46% a 62%]); no entanto, devido ao seu maior número, as infecções não documentadas foram a fonte de infecção para 79% dos casos documentados. Essas descobertas explicam a rápida disseminação geográfica do SARS-CoV2 e indicam que a contenção desse vírus será particularmente desafiadora.

Infelizmente, o canário da mina esqueceu de cantar ainda que estivesse vivo!

Me lembrei da frase do Steve Jobs: “Você não consegue ligar os pontos olhando pra frente; você só consegue ligá-los olhando pra trás. Então você tem que confiar que os pontos se ligarão algum dia no futuro. Você tem que confiar em algo – seu instinto, destino, vida, carma, o que for”

Refletindo com a frase icônica do Steve Jobs, a minha confiança profissional se remete no isolamento social através do senso de comunidade.

Desta maneira, peço que fiquem em casa. Exercitem o isolamento social! A minha saúde é a sua saúde e vice-versa! Eu me importo com você!

Posso estar errado mas um estudo realizado por pesquisadores da Fundação Gates utilizando modelagem computacional, foi demonstrado que uma adesão a 75% as medidas de isolamento social levaria apenas a 1.700 infecções estimadas e a 30 óbitos estimados. Em contrapartida, manter as atividades rotineiras causaria 25.000 novas infecções estimadas e 400 óbitos. Os pesquisadores se basearem nos dados da China e aplicaram na população de 2 condados de Seattle.

Termino com uma frase:

Nunca sabemos quando uma pandemia irá nos atingir. Mas podemos ter certeza de duas coisas. Qualquer coisa que realizarmos antes de uma pandemia parecerá alarmista. Qualquer coisa que realizarmos depois da pandemia soará inadequado. Esse é o dilema que passamos. Entretanto, isso não deverá nos impedir de realizar o nosso preparo. Necessitamos veicular a todos, palavras e mensagens que informem e não inflamem. Necessitamos encorajar a todos que se preparem, mas que não entrem em pânico
- Michael Levitt, Secretário do Departamento de Defesa, Pandemia de Influenza, 2007

 

Deixo abaixo um gráfico publicado pelo Luciano Tavares no brilhante artigo de chamada de ação. Clique aqui para ver o artigo. 

Juntos chegaremos lá! Eu me importo com você! Fique em casa!

 


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