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A (falta de) saúde mental de Evangelion - Parte 1: A série clássica

A (falta de) saúde mental de Evangelion - Parte 1: A série clássica
Henri Hajime Sato
ago. 17 - 9 min de leitura
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Alerta: Tem spoiler, mas qual é? 20 anos de casa e tem na Netfix(Me patrocina?) 

Evangelion é uma série animada sobre crianças pilotando robôs gigantes (os EVA) em um mundo se reconstruindo após um efeito cataclísmico para evitar que monstros (chamados de anjos) destruam o que sobrou.  

Enredo simples, tiro, pancada, sangue e tripa. Tudo o que um jovem gosta. No Japão vende boneco, jogos de azar, sapato e até colírio. O merchandising de Evangelion talvez só perca em nível de clássico para as séries Dragon ball, Gundam, Digimon e Pokémon. 

Porém à medida que a história e a qualidade gráfica se desenvolve começa a se equiparar em narrativa aos Estúdios Ghibli e a qualidade da animação Disney. 

A Saúde mental dos personagens e suas interações são o que fazem justamente a série passar de um desenho genérico de robôs gigantes no começo de alguns episódios e filmes para uma franquia de sucesso. Isso e alguns fanservices. 

Dizem que o criador da série, Hideaki Anno estudou um pouco de psicanálise ao desenvolver os personagens, mas carece de fontes concretas. E dizem as fontes que ele realmente tinha depressão clínica e resolveu usar a obra Neon Genesis Evangelion como uma expressão.

O que se sabe é que os personagens têm características tão complexas de psicopatologia que são cativados e odiados até hoje.  

É fácil classificar os personagens a partir de análises psicológicas, a internet está até saturada, mas vou evoluir isso a mais considerando o que todo mundo diz sobre alguns personagens e o enredo eu colocarei as atribuições externas para a saúde mental. 

Então prepare a pipoca, o ISRS e o Benzo.

Shinji é o protagonista, é quase unânime pelos fãs e na série que ninguém gosta dele, quem assiste não gosta, os personagens ao seu redor têm antipatia, seu pai não gosta dele, nem ele gosta dele mesmo, e o quadro continua por mais que ele ganhe reconhecimento e amigos o sentimento negativo persiste. E é nessa situação que encontramos as sutilezas da saúde mental. 

Shinji tem o quadro clássico de depressão com tudo que tem direito a fatores de risco para o desenvolvimento da patologia.  

Sua mãe morreu, o pai o abandonou, todos o enxergam somente como só “o piloto salvador da humanidade” ou “o idiota que destrói a cidade a cada luta” e a única coisa que ele gostaria era ser “deixado em paz”

É uma personagem chata, birrenta que ninguém aguenta ou sabe abordar adequadamente. 

Uma pessoa que, como disse acima, é o exemplo do típico caso de depressão, da realidade da pessoa comum, ninguém gosta, compreende, porém machuca refletir:

A realidade da pessoa com depressão não é legal, é uma doença complexa de lidar e quem não é da saúde acha até chato e confuso. 

Asuka é a demonstração clássica da pessoa “mais doente é a que transmite mais saúde”

Todos nós conhecemos a pessoa que diz emitir saúde física ou mental e no fundo é totalmente quebrada. 

Ela se considera madura, bonita, inteligente e perfeita combatente.  

No fundo ela é histriônica, vive querendo provar ser a melhor para provar a tudo e a todos que era a melhor.

Porém quando conseguiu algo próximo a isso, a mãe tentou matá-la em um surto psicótico antes de tentar suicídio, nunca conheceu seu pai (somente sabia que ele era de perfil genético perfeito) e como piloto EVA, fato que ela vivia se se exibindo por ser a melhor, por azar acabou perdendo para o deplorável Shinji.  

Tudo o que ela queria era alguém para abraçar, chegando até dar em cima de forma sexual de um homem mais velho para ter seus sentimentos edipianos correspondidos (Freud filha explica).

Rei Ayanami é o caso mais simples e complexo. Ela é um ser humano artificial e vazio, toda sua construção mental foi pré-programada para ter afeição ao pai de Shinji, sendo um clone de sua falecida esposa, mãe do protagonista. Porém ao decorrer da série a correspondência da afetividade de Shinji (Freud pai explica) a fez desenvolver fatores, laços e sentimentos ao nível de se sacrificar ao bem maior de seu filho e consequentemente uma não correspondência ao pai do mesmo. 

Dizem que Rei Ayanami é o típico caso das crianças lobo que foram criadas fora do convívio humano e foram inseridas abruptamente na sociedade, porém, como não tenho experiência em ler sobre o fato e as histórias das crianças lobo são muito questionáveis, não irei continuar. 

E temos Kaworu Nagisa, o último anjo. Kaworu é um dos personagens mais perigosos em saúde mental da série. Ele é a encarnação de tudo o que talvez a psiquiatria e psicologia tenham mais medo: o famoso abismo que contempla de volta.  

O garoto calmo, de feições delicadas, bom de conversa, empático ao ponto de Shinji se abrir (de acordo com alguns críticos) até sexualmente e induz ao pensamento de como você pode acabar com a dor e o sofrimento mental: “Junte se a mim e morra”

Na morte não há dor, tristeza, isolamento ou ódio. Mas não há alegria, união e felicidade. Dane-se você, de quem está do lado ou pior, como disse acima, se você isolar uma pessoa e surgir um Kaworu dentro ou fora da sua vida nesse momento, isso é algo extremamente perigoso: "O abismo que te contempla". 

E pior, se você se abrir a esse lado em momentos errados, você pode ter grandes problemas. Não que isso tenha acontecido comigo. 

Discutir os episódios e personagem um por um seriam longos e desnecessários para o texto, maternidade/paternidade, transtorno de stress pós-trauma e tem até quem enxergue analogias à psicose médica. 

O final do anime saiu de forma que nenhuma criança ou jovem entendeu e só lembra do meme "parabains", é praticamente uma sessão de terapia concentrada ou aquele famoso “aquele momento que de verdade a pessoa se encara”.  

 

  PS: Eu gosto mais do meme "PARABENS ZÉ"

Jung chama isso de Self e quando encarar seus arquétipos principalmente anima e assombra. Mas discutir arquétipos valem um livro e outro post cheio de referências e fanservice.  E sinto dizer, mas o arquétipo de um certo best seller não é Junguiano, na verdade eu acho até que é clickbait em livro.

E se os da MBE acharem que estou falando abobrinha, já existem estudos sobre abandono familiar em pacientes com doença mental leve e moderado. A estatística assusta (assim como você esta disposto a me criticar, não estou em ficar te mostrando, digite no pubmedparental "abandon" and mental disease).

Todos os personagens têm algo em comum e aí que mora a magia da psicopatologia da série: os transtornos mentais dos personagens não são engraçados ou empáticos, pelo contrário, todo mundo odeia, são repulsivos e agoniantes. 

Experimente identificar, conviver e analisar todos os aspectos da psicologia médica de um paciente, um colega, um amigo ou familiar, é difícil e não se resume à "entrevista psiquiátrica"(como eu detestava isso na faculdade).  

Um desafio: Quando foi que a vida ou faculdade de medicina te ensinaram a lidar com isso adequadamente? 

Citar Nise da Silveira, a luta antimanicomial, apoiar o famosinho com depressão a distância é fácil.  Difícil é estudar psiquiatria e psicologia médica.

É uma dificuldade que hoje sucateia o cuidado em saúde mental, transformando o que deveria ser um fator de reflexão social, em no máximo militância barata atendendo objetivos de grupos convenientes de políticos e até comerciais.   

O final do mangá saiu no penúltimo volume, quase 10 anos após o publicado em 2011 e o último saiu 3 anos após o anterior. Eu sei, comprei na época da faculdade e na época tinha que escolher entre a coxinha da tarde ou minha coleção. 

E foi um final bem satisfatório, e menos confuso, em que Shinji em uma inteligência coletiva encara que a coletividade sempre falha a meu ver: entender o indivíduo e suas reais necessidades. 

E assim foi Evangelion e a psicopatologia, até os idos de 2010 quando o autor lançou em formato de longa metragem um remake (e se o mangá for seguido à risca, quase uma sequência) a série rebuild. 

Mas para isso aguardem a parte 2. 

Enquanto não chega, assistam a uma obra prima mais que ASMR

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