O curso de Medicina ainda é um dos cursos mais concorridos no Brasil, e o nível de exigência acadêmica durante a graduação também é altíssimo. As disciplinas curriculares variam pouco entre as universidades, sendo raras as instituições que oferecem alguma matéria na área de comunicação.
A grande maioria das reclamações de pacientes acerca do atendimento médico não estão relacionadas à falta de domínio do conteúdo pelos profissionais. Dificilmente encontraremos alguém que questione a capacidade técnica do profissional. Por outro lado, as queixas de pacientes quase sempre convergem para a falta de clareza, má relação entre médico e paciente, falta de empatia, explicações mal dadas – enfim, problemas de comunicação.
Diante deste cenário entra a importância da oratória no meio médico. Seu objetivo é, em última análise, fazer com que o paciente entenda exatamente o que o profissional quer que o outro entenda. Neste contexto, ela não tem a ver com a oratória que conhecemos da política, que muitas vezes engana o interlocutor por meio de palavras, ou que busca impressionar outrem por meio de dissimulações. Ela busca tão somente otimizar a comunicação entre o médico e o paciente e fazer com que este se sinta bem tratado.
É importante, em primeiro lugar, cumprimentar o paciente de maneira simpática quando este adentra o consultório. Isso faz, em primeiro lugar, com que ele fique mais à vontade para explicar o que sente e aumenta as chances de sucesso diagnóstico e terapêutico. Utilizar linguagem simples nas explicações, deixando de lado expressões técnicas e jargões médicos, também facilita a compreensão e adesão ao tratamento. Em especial, quando da comunicação de notícias ruins, fazê-la de maneira delicada, empática, não mecânica e cuidadosa é imprescindível para gerar conexão e trazer conforto para o paciente. Isso é mais importante do que utilizar um monte de palavras "bonitas".
A escola de negócios Conquer, em seu e-book “O guia definitivo para falar bem em público”, publicou algumas dicas para melhorar a comunicação no âmbito profissional. Algumas das sugestões, que adaptei para a realidade médica, são:
- Tenha uma postura adequada, linguagem corporal que demonstre autoridade e acessibilidade, respiração e movimentos naturais;
- Evite gestos e movimentos involuntários, como tiques, que podem distrair o interlocutor;
- Faça pausas quando estiver falando, e busque se comunicar com o paciente, perguntando se ele tem alguma dúvida, por exemplo;
- Olhe nos olhos do paciente, fazendo com que ele se sinta acolhido;
- Utilize recursos visuais, como desenhos, gráficos, figuras, mas não exagere;
- Se você estiver no começo da carreira ou ainda estudando, vale a pena gravar uma explicação sua de algo por uns 3 minutos, e depois mostrar para pessoas de confiança darem um feedback, observarem se a explicação foi compreensível, qual foi seu tom de voz, se há vícios de linguagem...;
- Quando você for explicar algo para o paciente, busque utilizar argumentos racionais (dados, pesquisas, números) e emocionais (metáforas, analogias, storytelling...).
Granger Avery, presidente da Canadian Medical Association (CMA), considera que a quantidade de tempo que o médico tem à sua disposição é um dos maiores desafios na construção de uma relação de confiança com o paciente. Ele ressalta a importância de o médico escutar verdadeiramente o paciente e vice-versa. Segundo Avery:
“A boa comunicação entre o médico e o paciente é de importância fundamental, porque, se não tivermos isso, todo o resto não funcionará tão bem”.
Termino este texto com um poema de Manoel de Barros, convidando todos a utilizarem melhor as palavras e a oratória na lida com seus pacientes:
“Que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.”
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Referências
Conquer. O guia definitivo para falar bem em público. Disponível em < https://materiais.escolaconquer.com.br/ebook-falar-em-publico?_ga=2.127205389.1226238823.1602202952-1109405612.1601993970&_gac=1.91376104.1602024979.CjwKCAjwq_D7BRADEiwAVMDdHkdVi5frgniIGVzvTZ-6I7oE7qt06kz7KXFZDA6YHlydLI6SWe6AExoCkGMQAvD_BwE>
Owens B. CMA adopts patient focus. CMAJ. 2017;189(33):E1079. doi:10.1503/cmaj.1095465