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Antibiótico comum pode acelerar resistência bacteriana, revela estudo

Antibiótico comum pode acelerar resistência bacteriana, revela estudo
Comunidade Academia Médica
jun. 11 - 4 min de leitura
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Um dos pilares no tratamento de infecções do trato urinário, o antibiótico ciprofloxacino, pode estar, paradoxalmente, contribuindo para o fortalecimento das bactérias. É o que aponta um estudo da Rutgers Health, publicado na Nature Communications, que investigou como mudanças no metabolismo bacteriano induzidas por antibióticos podem impulsionar tanto a sobrevivência quanto a evolução da resistência de microrganismos como a Escherichia coli.

A pesquisa, teve como foco o papel da adenosina trifosfato (ATP), a principal “moeda energética” das células. O estudo demonstrou que o ciprofloxacino provoca uma crise energética nas bactérias ao reduzir drasticamente os níveis de ATP, desencadeando o que se conhece como “estresse bioenergético”.

Para investigar o impacto dessa condição, os pesquisadores manipularam geneticamente cepas de E. coli para que consumissem continuamente suas reservas de ATP e NADH (um cofator metabólico relacionado). Ao expor essas cepas modificadas e outras normais ao ciprofloxacino, os resultados foram inesperados: apesar da baixa de energia, as bactérias reagiram intensificando sua respiração celular, o que aumentou a produção de espécies reativas de oxigênio (ROS), conhecidas por causar danos ao DNA.

Dois resultados preocupantes

Esse metabolismo acelerado levou a dois desfechos que desafiam o entendimento tradicional sobre antibióticos:

  1. Aumento da sobrevivência das bactérias: Nos testes chamados de time-kill, as bactérias sob estresse energético apresentaram uma taxa de sobrevivência até 10 vezes maior frente ao ciprofloxacino do que as bactérias normais. Isso ocorreu devido à formação de células persistentes, microrganismos que permanecem dormentes durante a presença do antibiótico, mas que podem reativar a infecção posteriormente. Tradicionalmente, se acreditava que essas células se formavam em ambientes de metabolismo lento, mas o estudo mostrou que o oposto também pode ocorrer: a ativação de respostas de estresse e a tentativa de reabastecer energia favorecem sua formação.

  2. Aceleração da evolução da resistência genética: As E. coli estressadas também desenvolveram resistência genética ao ciprofloxacino mais rapidamente — quatro ciclos antes que as cepas controle. Testes adicionais mostraram que o dano oxidativo ao DNA, seguido por mecanismos de reparo propensos a erros, foram responsáveis por essa evolução acelerada.

Outro achado significativo, foi que o efeito de esgotamento energético não é exclusivo do ciprofloxacino. Antibióticos como gentamicina e ampicilina também causam queda nos níveis de ATP. Essa resposta metabólica pode, portanto, estar presente em diversos tipos de patógenos, inclusive em microrganismos de difícil tratamento como o Mycobacterium tuberculosis, que é altamente sensível a alterações nos níveis de ATP.

As descobertas evidenciam o combate à resistência antimicrobiana, que atualmente contribui para 1,27 milhão de mortes por ano no mundo. Ignorar os efeitos metabólicos dos antibióticos pode ser um erro estratégico. Os autores propõem três frentes de ação:

  1. Desenvolvimento de antibióticos mais inteligentes: Novas moléculas devem ser testadas não apenas pela sua eficácia direta, mas também por possíveis efeitos colaterais sobre o metabolismo bacteriano que possam favorecer a resistência.

  2. Combinação com bloqueadores de evolução: Antibióticos poderiam ser administrados em conjunto com substâncias que inibem as vias de estresse bacteriano ou neutralizam os radicais livres gerados no processo.

  3. Reavaliação da prática de doses altas: A tradição de utilizar a dose máxima possível pode ser contraproducente. Altas concentrações de antibióticos podem, justamente, induzir o tipo de estresse que fortalece os microrganismos.

“Os antibióticos estão transformando nossos ataques em campos de treinamento para as bactérias,” afirma um dos pesquisadores. “Se conseguirmos cortar a energia desses campos, poderemos manter a eficácia dos antibióticos por mais tempo.”

Essa pesquisa oferece uma nova perspectiva sobre como os antibióticos interagem com as bactérias e sugere que o caminho para conter a resistência pode passar pela compreensão mais profunda da bioenergética microbiana. Trata-se de uma abordagem promissora em um momento crítico na luta global contra as superbactérias.


Referência:

Rutgers University. "How a common antibiotic fuels bacterial resistance." ScienceDaily. ScienceDaily, 9 June 2025. <www.sciencedaily.com/releases/2025/06/250609073225.htm>.



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