A incidência de sífilis nos Estados Unidos tem apresentado um aumento alarmante, passando de 6.100 casos em 2001 para impressionantes 203.500 em 2022, com um aumento correspondente nas hospitalizações por uveíte sifilítica. O tratamento convencional para a sífilis ocular, conforme recomendado pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos EUA, envolve a administração de penicilina G cristalina intravenosa. Este método, apesar de amplamente utilizado, nunca teve sua superioridade comprovada em estudos clínicos comparativos com outras alternativas, além de representar riscos significativos e custos elevados associados a hospitalizações e uso de cateteres intravenosos.
Diante desses desafios, um estudo retrospectivo conduzido pela Universidade do Sul da Califórnia apresenta uma alternativa promissora: o tratamento ambulatorial com doxiciclina oral. Este estudo, realizado de janeiro de 2017 a dezembro de 2023 em Los Angeles, incluiu pacientes diagnosticados com sífilis ocular que optaram, através de uma decisão compartilhada, por um regime de doxiciclina oral de 200 mg duas vezes ao dia por 28 dias, iniciado em janeiro de 2022.
Os resultados deste estudo são notáveis. A acuidade visual dos pacientes tratados com doxiciclina melhorou ou permaneceu estável em 94% dos casos, similar àqueles que receberam penicilina IV. Além disso, 92% dos pacientes tratados exclusivamente com doxiciclina conseguiram evitar completamente a hospitalização e o uso de linhas IV, com todos os pacientes mostrando uma redução de quatro vezes nos títulos de RPR (um teste para sífilis) após nove meses de acompanhamento, indicando uma resposta serológica adequada ao tratamento.
Este estudo sugere que a doxiciclina oral pode ser uma alternativa segura e eficaz para o tratamento da sífilis ocular em um subconjunto selecionado de pacientes. Esta abordagem além de evitar riscos associados ao tratamento intravenoso e à hospitalização, também se mostra eficaz tanto clínica quanto serologicamente. A eficácia da doxiciclina, já demonstrada em fases primárias, secundárias e latentes da sífilis, reforça sua utilidade como uma opção de tratamento mais flexível e com potencial de reduzir significativamente os custos de saúde.
🟦 A tabela a seguir compara as características de acompanhamento, uveíte, acuidade visual e títulos RPR entre os grupos tratados com doxiciclina oral e penicilina IV, destacando diferenças significativas e resultados semelhantes entre os tratamentos:
Fonte: Bao YK, Hwang J, Long C, et al.,2024
Contudo, os autores do estudo destacam que, apesar dos resultados promissores, são necessários estudos prospectivos adicionais para uma análise mais aprofundada dos efeitos clínicos e serológicos da doxiciclina no tratamento da sífilis ocular. A possibilidade de tratar eficazmente essa condição com um regime oral abre novas portas para o manejo da sífilis, reduzindo a carga sobre os sistemas de saúde e oferecendo uma opção menos invasiva aos pacientes.
Referência:
Bao YK, Hwang J, Long C, et al. Outpatient Oral Doxycycline Therapy for Ocular Syphilis. JAMA Netw Open. 2024;7(12):e2449364. doi:10.1001/jamanetworkopen.2024.49364