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É infarto, e agora?

É infarto, e agora?
Ana Carolina Sena
dez. 2 - 11 min de leitura
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O coração, como qualquer órgão, precisa de um suprimento sanguíneo para nutrir suas células (os miócitos), esse suprimento é feito por meio de vasos denominados coronárias.

Infarto agudo do miocárdio (IAM) significa que houve uma diminuição desse fluxo sanguíneo acarretando lesão das células cardíacas. Sua principal causa é a aterosclerose, doença na qual há o acúmulo de gordura nos vasos.

Essa doença ocasiona a formação de placas que estreitam os vasos sanguíneos e podem também sofrer ruptura ou erosão levando a formação de trombos. Os trombos podem obstruir parcialmente ou totalmente os vasos levando assim a isquemia.

Fonte: THALER, Malcom S. ECG essencial: eletrocardiograma na prática diária. Porto Alegre: Artmed, 2013.

Quando suspeitar de IAM?

Deve-se suspeitar em qualquer paciente que apresente queixa de dor, desconforto torácico ou dispneia.

Pacientes idosos, mulheres e diabéticos podem apresentar manifestações atípicas (náuseas, vômitos, palpitações ou sintomas respiratórios).

O diagnóstico é realizado pela clínica, enzimas cardíacas e alterações eletrocardiográficas.

A abordagem inicial ao paciente com suspeita de IAM deve ser o mais precoce possível e inclui:

  • História e exame físico direcionados – na história, lembre-se de caracterizar a dor (intensidade, duração, caráter, semelhança com episódios anteriores, fatores de melhora e piora) e de perguntar sobre a história pregressa de fatores de risco para doenças coronarianas; e no exame físico procure sinais de gravidade como, por exemplo, má perfusão.
  • Monitorização do paciente (pressão arterial, frequência cardíaca)
  • Suplementação de oxigênio se necessário, ou seja, em pacientes com saturação < 94%, congestão pulmonar ou na presença de desconforto respiratório
  • Acesso venoso para administração de medicamentos
  • Coleta de sangue para enviar ao laboratório e dosar enzimas e proteínas cardíacas especificas que sinalizam lesão dos miócitos
  • Eletrocardiograma (ECG) padrão de 12 derivações precoce (realizado e interpretado em até 10min após o contato médico)

O ECG auxilia na diferenciação dos diversos tipos de infarto do miocárdio (IM), sendo que os 2 principais são Infarto agudo do miocárdio sem supra de ST (IAMSST) e Infarto agudo do miocárdio com supra de ST (IAMCSST).

“Mas eu não sei nem o que significa esse ST ou como identificar um ECG característico de infarto!”

Calma, vamos tentar ajudá-lo!

 O ECG é um exame que vai mostrar como está o funcionamento elétrico do coração. São colocados eletrodos no paciente e o traçado gerado possui ondas que refletem como está a atividade elétricas das células miocárdicas.

            Observe abaixo as ondas geradas e a determinação de segmentos e intervalos que podemos analisar em um ECG normal e o que cada uma representa:

Fonte: THALER, Malcom S. ECG essencial: eletrocardiograma na prática diária. Porto Alegre: Artmed, 2013.

  • A onda P reflete a despolarização atrial.
  • O intervalo PR é o tempo entre o iníci
  • o da despolarização atrial e ventricular.
  • O complexo QRS reflete a despolarização ventricular.
  • O segmento ST é o tempo entre o fim da despolarização e o início da repolarização ventricular.
  • A onda T reflete a repolarização ventricular.
  • E o intervalo QT engloba o conjunto de despolarização e repolarização dos ventrículos.

Lembrando que a despolarização está relacionada com a entrada e saída de íons que gera a contração celular e como consequência contração das câmaras cardíaca; e a repolarização seria o retorno ao “estado basal” no qual ocorre o relaxamento das câmaras cardíacas.

            Esse é apenas o básico sobre o traçado do ECG que é um assunto extenso e complexo, mas agora você sabe o que é o segmento ST. Sendo que as alterações no segmento ST podem ser normais, pois além do traçado do ECG tudo depende da clínica do paciente.

            Mas qual o ECG característico de IM? Em pacientes com isquemia ou infarto, o traçado vai depender de diversos fatores como: a duração do evento isquêmico, a quantidade de miocárdio afetado, qual parede do coração foi acometida (anterior, lateral ou ínferoposterior), além de quais as anormalidades basais que o paciente já apresentava antes desse infarto.

            Os Biomarcadores cardíacos auxiliam tanto no diagnóstico quanto no prognóstico dos pacientes. Os principais são a isoenzima MB da creatinina quinase (CK-MB), a mioglobina e as troponinas I e T.

  • As troponinas são proteínas do complexo de regulação miofibrilar e não estão presentes no musculo liso. Comparada com a CK-MB as troponinas tem maior especificidade e detectam pequenas quantidades de lesão miocárdica, além de permanecerem elevadas por tempo mais prolongado. E sempre que a troponina ultrassensível estiver disponível ela é o biomarcador de escolha.
  • A CK-MB é um marcador precoce de lesão miocárdica (menos de 6h), porém sua menor especificidade é uma limitação no seu uso, além de ser relativamente insensível para detectar pequenas lesões nas células miocárdicas.
  • A mioglobina é um marcador precoce de necrose miocárdica elevando-se em 2-5h, porém não é um marcador cardio específico.

Lembrando que os marcadores nunca devem ser utilizados de forma isolada, e o diagnóstico de IAM é clínico. As enzimas cardíacas, assim como o ECG, devem ser dosadas de forma seriada para avaliar o grau de extensão da necrose - no momento dos sintomas, 3 e 6h após.

Mas qual a diferença entre IAM sem supra de ST e IAM com supra de ST? Vamos abordar agora um pouco sobre cada um:

Infarto agudo do miocárdio sem supra de ST (IAMSSST)

No IAMSSST a sintomatologia do paciente pode variar muito, não é sempre aquela sintomatologia típica como no IAM com supra de ST. Os sintomas podem ser desde uma dor de pequena intensidade, sem outras queixas associadas, até um choque cardiogênico ou uma parada cardiorrespiratória.

            Existem ferramentas utilizadas para estratificar o risco do paciente com IAMSST e elas impactam na tomada de decisão, isto é, se deve ser realizada uma estratégia invasiva precoce, sendo que as mais utilizadas são Global Registry of Acute Coronary Events (GRACE) e Thrombolysis in Myocardial Infarction (TIMI).

Sendo que os fatores de risco para essa doença são:

  • Idade: homens>55anos e mulheres>65anos
  • Tabagismo
  • Dislipidemias = triglicerídeos iguais ou acima de 150mg/dL
  • LDL colesterol maior que 100mg/dL e HDL <40mg/dL
  • Diabetes mellitus
  • História familiar prematura de doença cardiovascular: homens < 55 anos e mulheres < 65 anos
  • Hipertensão arterial sistêmica

            No ECG os achados consistentes com IAMSST são: uma nova depressão do segmento ST igual ou maior a 0,5mm em duas derivações contíguas e/ou uma inversão da onda T>1mm em duas derivações contíguas com onda R proeminente ou a relação R / S> 1.

 O tratamento consiste em:

1.Antiagregante plaquetário

Ácido acetilsalicílico (AAS) – 300mg (2-3 comprimidos mastigados), com dose de manutenção de 100mg.

Clopidogrel 300mg ou Ticagrelor 180mg

2.Anticoagulante

Enoxaparina 1mg/kg e subcutâneo a cada 12/12h, lembrando que em pacientes com mais de 75 anos a dose é 0,75mg/kg

3.Outras terapias

  • Suplementação de O2 quando necessária
  • Antianginosos: nitrato (contraindicado em pacientes que utilizaram inibidor fosfodionesterase nas últimas 24h) e morfina para alívio da dor anginosa
  • Medicações que melhoram o remodelamento e a sobrevida em longo prazo: estatina, β-bloqueador e IECA

4.Paciente de alto risco deve ser submetido ao cateterismo cardíaco imediato

Infarto agudo do miocárdio com supra de ST (IAMCSST)

            No IAMCSST o mais importante é o reconhecimento imediato, pois quanto antes for realizada a terapia de reperfusão melhor: tempo é músculo! Logo, em um paciente no qual o ECG indica IAMCSST não se deve esperar o resultado das enzimas cardíacas para iniciar o tratamento.

            O paciente apresenta um quadro mais característico com dor em aperto, irradiação para membro superior esquerdo ou mandíbula, insidiosa que melhora com repouso.

            O ECG de um paciente com IAMCSST, apresenta elevação do segmento ST, medida no ponto J, ≥0,1 mV, com exceção nas derivações V2 e V3, na qual pode indicar repolarização precoce, logo nesses derivações a elevação deve ser ≥0,2 mV em homens ≥40 anos, ≥0,25 mV em homens <40 anos e ≥0,15 mV em mulheres.

Fonte:UpToDate, 2020

As derivações refletem qual local do miocárdio foi acometido, se a elevação do segmento ST for nas derivações:

  • V1-V2, ocorre o acometimento da região Anteroseptal
  • V3-V4, o acometimento é da região Anteroapical
  • V5-V6, a lesão ocorreu na região Anterolateral
  • I, aVL, houve acometimento da região Lateral
  • II, III, aVF, a lesão foi na parede Inferior

            O melhor tratamento é a angioplastia primária que deve ser realizada até 120min.

            O tratamento farmacológico consiste em:

Uso de fibrinolíticos em até 12h, menos em pacientes com contraindicações que incluem presença de qualquer sangramento como acidente vascular encefálico, dissecção aguda da aorta, além de traumas na cabeça e neoplasias no sistema nervoso central.

1.AAS – 325mg mastigável durante o primeiro atendimento que deve ser realizada ainda antes do ECG. Com uma dose de manutenção de 160mg ao dia.

2.Clopidogrel e Ticagrelor seu uso associado ao AAS reduz eventos cardiovasculares maiores.

A dose de ataque do Clopidogrel é 300mg, e se o paciente for submetido ao cateterismo a dose é 600mg; a dose de manutenção é 75mg ao dia

O Ticagrelor tem dose de ataque de 180mg e em seguida pode ser administrado 90mg, duas vezes ao dia.

3. A enoxiaparina deve ser administrada 1mg/kg de peso, com exceção nos pacientes com 75 anos ou mais em que a dose é 0,75mg/kg.

4. Em pacientes sem contraindicação deve-se utilizar o betabloqueador nas primeiras 24h.

5. Alteplase na dose de 15 mg endovenosa em bólus, seguidos por 0,75 mg/kg em 30 minutos e, então, 0,50 mg/kg em 60 minutos A dose total não deve exceder 100 mg.

 

Referências

GOLDBERGER, Aryl L. PRUTKIN, Jordan M. Electrocardiogram in the diagnosis of myocardial ischemia and infarction. UpToDate, 2020. Disponível em: <https://www.uptodate.com/contents/electrocardiogram-in-the-diagnosis-of-myocardial-ischemia-and-infarction?search=heart%20atack&source=search_result&selectedTitle=5~150&usage_type=default&display_rank=5#H17>

PIEGAS, Leopoldo Soares et al. V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnível do segmento ST. Arquivos brasileiros de cardiologia, v. 105, n. 2, p. 1-121, 2015.

PRUTKIN, Jordan M. ECG tutorial: Myocardial ischemia and infarction. UpToDate, 2019. Disponível em: <https://www.uptodate.com/contents/ecg-tutorial-myocardial-ischemia-and-infarction?search=heart%20atack&topicRef=2095&source=see_link#H99423333>

REEDER, Guy S. KENNEDY, Harold L. Overview of the acute management of ST-elevation myocardial infarction. UpToDate, 2020. Disponivel em: <https://www.uptodate.com/contents/overview-of-the-acute-management-of-st-elevation-myocardial-infarction?search=heart%20atack&source=search_result&selectedTitle=1~150&usage_type=default&display_rank=1#H1>

SIMONS, Michael. BREALL, Jeffrey A. Overview of the acute management of non-ST elevation acute coronary syndromes. UpToDate, 2018. Disponível em: <https://www.uptodate.com/contents/overview-of-the-acute-management-of-non-st-elevation-acute-coronary-syndromes?search=non-ST%20elevation&source=search_result&selectedTitle=1~150&usage_type=default&display_rank=1#H19>

THALER, Malcom S. ECG essencial: eletrocardiograma na prática diária. Porto Alegre: Artmed, 2013.


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