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Erro médico: a importância do pedido de desculpas

Erro médico: a importância do pedido de desculpas
ANA CAROLINA AZEVEDO SALEM
mar. 29 - 5 min de leitura
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Desde antes de entrar na faculdade, eu já pensava sobre a responsabilidade que é ser médico: ter uma vida em suas mãos e não ter o direito de errar. E sinto um certo arrepio até, de pensar que um erro meu, pode custar a vida de alguém. Por mais que o estudo e a dedicação sejam constantes, é impossível não estarmos sujeitos a erros, afinal, somos humanos!

Mas por que então é tão difícil falar no erro médico? Justamente porque a medicina lida diretamente com a vida, admite-se socialmente que o médico não tenha o direito de errar. E não se trata apenas de competência, até os médicos mais bem gabaritados ou experientes não estão imunes ao erro, porque é inerente ao ser humano.

Não se trata de justificar um erro por negligência, má prática, ou falta de conhecimento, existem casos e casos, o objetivo do texto não é esse. Mas tentar abordar um assunto que ainda é muito recriminado e obscuro na prática médica.

O que precisa ser mudado, é a forma como isso é visto, seja pela comunidade, pelos próprios médicos e até nas universidades. Por ser tratado assim, ao considerar o erro médico inadmissível, muitos médicos têm vergonha de assumir o erro para o paciente, familiares de pacientes e até mesmo para os próprios colegas, com medo de julgamentos e processos. Mas ao contrário de outras profissões, na medicina, inevitavelmente o erro vai aparecer, podendo até culminar com a morte do paciente, nos casos mais graves.

Assumir o erro então, tentando se desculpar com o paciente, ou com os familiares pode ser uma “forma de tentarmos nos colocar no lugar do outro, para imaginar sua dor”, como descreveu a médica Suzanne Koven em um artigo no blog KevinMd. Ao pedir desculpas, estamos sendo humanos, e como humanos assumindo que somos passíveis ao erro.

Mas não apenas isso, pedir desculpas, também pode ser um preventor de processos, como revela um artigo da Boston Globe Magazine. O autor Darshak Sanghavi revelou que os pacientes têm menos probabilidade de processar os médicos que admitem ter cometido um erro, principalmente se eles se desculparem por seus erros.

Felizmente, essa discussão está chegando às universidades, e programas inovadores como o da Universidade de Michigan, incentivam os médicos a revelarem os seus erros aos pacientes, e até oferecer uma compensação aos pacientes que podem ter sido prejudicados por esses erros, mesmo que esses pacientes não os tenha processado.

Falar sobre os próprios erros é muito difícil, mas na medicina é ainda pior, devido ao paradigma que se criou em torno disso, de que o médico tem que ser perfeito e nunca pode se enganar. Corajosamente, Brian Goldman, médico canadense, relata no TED alguns de seus erros e experiências como médico:

Veja o texto na Academia Médica:

 

Ele comenta também que a ideia de que o médico deve ser perfeito, advém do conceito de que se "eliminássemos" todos aqueles que cometem erros, teríamos um "sistema completamente seguro", o que na verdade é impossível, porque se fizéssemos isso, não sobraria ninguém.

O fato é que estamos em uma época, em que a ciência avança de tal forma que é humanamente impossível acompanhar todo o conhecimento, ou seja, tudo o que é produzido em medicina em tão pouco tempo. Precisamos ser excelentes  em um volume absurdamente grande de conteúdo, em apenas 6 anos. Precisamos lidar com  a privação do sono (de fato muitos erros costumam acontecer em final de plantão), com o volume excessivo de pacientes para atender por dia (sobretudo no sistema público) e ainda conseguir um tempo para se atualizar, para tentar acompanhar todo esse avanço.

Enfim, ao entrar na faculdade muitas vezes não nos damos conta da responsabilidade que tudo isso gera. Mas alguém precisa ser médico não é mesmo?  Como disse o médico Emerson Wolaniuk: "ainda não criaram um robô infalível para atuar nessa profissão". Sendo assim, ainda não dá pra esperar uma medicina imune ao erro.

O que precisamos fazer é superar esse sistema de completa negação dos erros, a fim de que o assunto possa ser tratado com mais naturalidade entre os colegas e com os pacientes. Assim, ao assumir um erro e pedir desculpa ao paciente ou familiar, estaremos assumindo a nossa condição humana, de que não somos perfeitos e estamos sim passíveis ao erro, e que isso não significa necessariamente que não sejamos bons profissionais.


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