Na primeira vez em que ouvi a palavra Ciência tinha 8 anos de idade. Estava em uma aula de Língua Portuguesa onde a Professora ensinava-nos a entender o significado das palavras no dicionário.
Na definição que vinha no Dicionário Aurélio, do qual nem me lembro a edição, constava:
Ciência (substantivo feminino):
- Conhecimento atento e aprofundado de algo.
Corpo de conhecimentos sistematizados adquiridos via observação, identificação, pesquisa e explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos, e formulados metódica e racionalmente.
Desde então me ocorreu que devia estar ciente dos fatos e, mais do que isso, não imaginava que iria migrar pelos campos da pesquisa científica.
Não sou uma grande pesquisadora, talvez nem tenha condições de me intitular assim. No entanto, existe algo inerente à todo o bom pesquisador que pode muito bem ser abordado nessa singela discussão de fatos: A ÉTICA.
Nestes tempos de mídias sociais, por mais que pareça anedótico o dizer, o papel do pesquisador é TRAZER VERDADES À TONA, sejam elas boas ou ruins.
O atual governo do país, ministrado pelo presidente Jair Bolsonaro, desde o início da Pandemia da COVID-19 vêm protagonizando inúmeros escândalos que tratam sobre a legitimação dos fatos.
Passamos pela negação da situação, pela raiva da cobrança por medidas, pela negociação com o Ministério da Saúde (MS), pelo rompimento de equipes, pela Onipotência das decisões e agora estamos diante da manipulação das estatísticas da COVID-19, na tentativa de omitir o real andamento da doença no território nacional. Ao mesmo tempo em que discutimos a implicação das FakeNews no gerenciamento de informações.
Mais do que contraditório parece que vivemos um paradoxo ético e moral de tudo o que havíamos construído de benéfico ao longo de décadas. Esse caso oferece a oportunidade de examinar como a manipulação ou fabricação de dados relaciona-se ao significado ético da pesquisa científica.
Em linhas gerais a má conduta na pesquisa pode ser denotada como um desvio de conduta na Confecção, Falsificação ou Plágio de dados e demais informações, que viola os padrões éticos básicos em pesquisa e pressupõe um juízo moral do pesquisador.
A epidemiologia e a bioestatística, que constituem a base da análise dos dados em saúde, colaboram na implementação de medidas com foco na resolutividade de problemas mas também levam em conta a implicação dos fatores de riscos existentes, visando sempre o melhor cenário para a população.
A propagação de "falsos resultados" pode muito bem legitimar a tomada de ações e, portanto, levar as pessoas a também legitimá-la como uma verdade, já que as figuras de autoridade de seu entorno, e muitas vezes de confiança, como é o caso do MS, são responsáveis por produzí-las.
Neste contexto nos deparamos com outro aspecto ético da condução das pesquisas: O Conflito de interesses.
Presume-se que há conflito de interesses quando ocorre uma incompatibilidade entre interesses pessoais e as obrigações de um indivíduo. Na medicina, ele pode ser exemplificado como uma oposição de vantagens, onde o bem estar da população é prejudicado em detrimento da manutenção da economia.
A essa altura da Pandemia TODOS estão cientes das consequências que o isolamento social acarretou, seja na economia, seja na saúde das pessoas. Porém TODOS deveriam optar pela priorização das medidas que menos malefícios tragam para a VIDA das pessoas e não para seus BOLSOS.
O tão almejado "pico de disseminação" do vírus SARS-CoV-2, onde o número de casos novos será menor do que o número de casos recuperados, não será obtido pela manipulação dos dados, muito pelo contrário, mais pessoas podem ser infectadas a cada dia se não tivermos uma ESTIMATIVA REAL da propagação da doença no Brasil.
O renome do setor governamental responsável pela administração e manutenção da Saúde pública do país, cujos dados são fonte de inúmeras pesquisas, notícias, artigos, dissertações e teses, não pode ser desacreditado pela falsificação intencional por partes que não entendem a dimensão de sua importância e assim, prejudicam seriamente a integridade básica da ciência e da pesquisa científica no Brasil.
Em verdade, relatar dados de maneira não negligente é tão moralmente fundamental ao meio científico que sua ausência contradiz a atividade que se autodenomina CIÊNCIA.
Referências:
1. Russo, Marisa. (2014). Ética e integridade na ciência: da responsabilidade do cientista à responsabilidade coletiva. Estudos Avançados, 28(80), 189-198.
2. Santos, Luiz Henrique Lopes dos. (2011). Sobre a integridade ética da pesquisa.(FAPESP).
3. Silva, Fabiana Divina da. et al. (2018). Ética e integridade: condutas para produções científicas no Brasil. Cogitare Enferm. (23)3: e54367.
4. Cavalcante, João Roberto, & Abreu, Ariane de Jesus Lopes de. (2020). COVID-19 in the city of Rio de Janeiro: spatial analysis of first confirmed cases and deaths. Epidemiologia e Serviços de Saúde, 29(3), e2020204. Epub June 03, 2020.
5. Goldstein, N. D., LeVasseur, M., & McClure, L. A. (2020). On the Convergence of Epidemiology, Biostatistics, and Data Science. Harvard Data Science Review.
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