O que é Medicina Translacional?
por Enéas Eduardo Sucharski
Ano passado eu estava em uma das sessões de orientação de um projeto de pesquisa com a Dr. Sharon Macdonald MD, chefe do departamento de Saúde da Comunidade em Winnipeg – Canadá, quando perguntei quais eram as suas áreas de maior interesse. Entre as respostas ela me disse que se interessava bastante pela área de medicina translacional, e eu sem ter a menor ideia do que se tratava, mas também hesitante em perguntar sobre o que se tratava e prolongar ainda mais a reunião , resolvi pesquisar sobre o tema quando chegasse em casa.
Descobri que a medicina translacional basicamente é uma área de estudo que visa agilizar a transferência de resultados de pesquisa básica para pesquisas clínicas, a fim de produzir benefícios para a comunidade como um todo. Ou seja, passar da teoria para a prática. Um exemplo disso seria fazer com que o estudo de um determinado receptor celular pudesse mais rapidamente influenciar a criação de uma nova droga. Mas a medicina translacional -em um sentido mais amplo- também pode compreender na translação dos mais variados tipos de conhecimento médicos para a prática clínica. Em outra ocasião, uma feira científica acontecia na Faculdade de Medicina em Winnipeg, onde muitos alunos dos primeiros anos estavam expondo seus trabalhos, que iam desde análises genéticas até estudos moleculares sobre determinados temas. Então encontro de repente o Dr. Ponnampalam, um hematologista que trabalhava no St. Boniface Hospital do outro lado da cidade , onde realizei a rotação de hematologia, quando ele me disse: muito interessantes esses trabalhos, mas a pergunta é como eles vão influenciar a nossa prática clínica? Essa pergunta do Dr. Ponnampalam é medicina translacional pura. Se trata de como utilizar dos novos conhecimentos médicos que estão surgindo para também melhorar a nossa prática médica.
A história da translação de conhecimentos para utilização na área médica é muito antiga. Podemos citar as realizações de Louis Pauster na microbiologia que influenciaram as técnicas antissépticas que continuam até hoje. No entanto a medicina translacional mais parecida com a que vemos hoje, começou por volta das décadas de 80 e 90 quando indústrias farmacêuticas americanas através da análise dos mecanismos celulares de doenças desenvolviam uma nova estratégia para criar novos medicamentos. Segundo Eduardo Moacyr Krieger, coordenador do programa de medicina translacional do Incor, o marco histórico da medicina translacional ocorreu quando o Instituto de Medicina da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos passou a realizar simpósios a fim de discutir a importância da investigação clínica para que ela tivesse capacidade de transformar o conhecimento advindo da área básica, visto que o desenvolvimento alcançado pela investigação clínica não era adequado para fazer isto na velocidade e com a eficiência necessárias.
O círculo virtuoso do desenvolvimento de uma nova terapia e como isso poderia ser melhorado com a participação da indústria (farmacêutica ou não).
No Brasil podemos citar o isolamento do veneno da Jararaca por Sérgio Henrique Ferreira - na década de 60 - que no futuro seria o Captopril, como uma utilização da medicina translacional.
Hoje já existem periódicos na área como o Journal of Translational Medicine e o Science Translational Medicine, e o investimento também é grande. Na esfera Nacional há o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Translacional em Medicina, que é um programa do CNPQ onde cerca de 122 projetos recebem o financiamento de cerca de R$ 607 milhões. Há núcleos espalhados no Sul e no Centro- Oeste do país. Existe também o programa de Cardiologia Translacional do Instituto do Coração, a rede nacional de pesquisa clínica e também há alguns cursos de pós graduação na área. Um exemplo é o curso de pós-graduação com mestrado/doutorado da Unifesp em medicina translacional.
O panorama é favorável, mas ainda há muito o que ser feito. Alguns desafios do Brasil na área são aumentar o número de patentes na área médica e aumentar o investimento em pesquisa médica como um todo. O Brasil gastou em 2013 R$ 248 milhões¹ em pesquisas na área de saúde, nem chegando perto do investimento em pesquisas em saúde dos EUA, que apenas em pesquisas com doença de Alzheimer gastou cerca de 500 milhões de dólares² no mesmo período.
1 http://portalsaude.saude.gov.br
2 http://report.nih.gov/categorical_spending.aspx
*Enéas Eduardo Sucharski é interno do Hospital Evangélico de Curitiba. Tem grande interesse pela área de Saúde Pública.