A revisão por pares é uma prática fundamental na ciência moderna, garantindo a validade e a confiabilidade dos estudos publicados. Entretanto, poucos sabem como essa prática evoluiu ao longo do tempo. Recentemente, a Royal Society, uma das mais antigas e prestigiosas sociedades científicas do mundo, ofereceu um vislumbre em sua rica história ao liberar mais de 1.600 relatórios de revisão, abrangendo o período de 1949 a 1954. Estes documentos, que agora fazem parte do arquivo histórico da sociedade, revelam muito sobre a evolução da revisão por pares.
A publicação da Nature em 15 de outubro de 2024, nos mostra que A Royal Society iniciou a prática de revisão por pares em suas publicações há quase 200 anos, mas foi somente nos anos 1970 que o processo se tornou mais formalizado. Antes disso, os relatórios de revisores poderiam conter desde atualizações sobre férias até comentários casuais sobre outras atividades dos revisores. Louisiane Ferlier, gerente de recursos digitais da sociedade, destaca que os primeiros relatórios eram muito mais informais e focados no diálogo entre cientistas. Essa troca franca, embora informal, era essencial para melhorar a comunicação dos resultados científicos.
Curiosidades e Desafios na Revisão por Pares
Os relatórios não apenas trazem insights sobre o processo científico, mas também revelam aspectos humanos e técnicos interessantes. Por exemplo, a química Dorothy Hodgkin, ao revisar o manuscrito sobre a estrutura do DNA de Francis Crick e James Watson em 1953, sugeriu que eles retocassem fotografias para eliminar reflexos indesejados – um problema que as câmeras modernas corrigem automaticamente. Além disso, os relatórios variavam enormemente em comprimento, desde breves anotações até extensas análises manuscritas de 24 páginas.
Fonte: Adam, D. (2024, October 15). Nature
Viés e Imparcialidade
O arquivo também é um testemunho dos desafios relacionados ao viés na revisão por pares. Relatos de revisores revelam que o conhecimento prévio sobre um autor poderia influenciar a confiança na análise apresentada. Em contrapartida, comentários extremamente negativos também demonstram como preconceitos pessoais poderiam afetar o julgamento sobre um trabalho.
Em 1901, o físico George Burch recomendou a publicação de um artigo apesar de não estar convencido pelos resultados e incapaz de replicá-los, preocupado que rejeitá-lo pudesse transmitir uma impressão de viés.
Fonte: Adam, D. (2024, October 15). Nature
Impacto da Tecnologia e Geopolítica
O advento do computador e suas aplicações também geraram debates. Alan Turing, por exemplo, enfrentou críticas e apoios divididos sobre seu trabalho em morfogênese química, que propunha novos métodos de modelagem matemática para a biologia. Além disso, durante períodos de tensão geopolítica, como a Segunda Guerra Mundial, a publicação de pesquisas era cuidadosamente avaliada para evitar que informações valiosas caíssem em mãos inimigas.
Interessantemente, a revisão por pares também serviu para ajudar as editoras a controlar custos. Revisores eram frequentemente questionados sobre a necessidade de figuras ou tabelas, ajudando a reduzir os custos de impressão, um aspecto prático, porém menos discutido, desse processo.
Ao entender as origens e as transformações na revisão por pares, podemos apreciar melhor seu valor inestimável na promoção de uma ciência rigorosa e imparcial. A revisão por pares continua a ser um pilar crucial na validação científica, e sua evolução é um testemunho do compromisso contínuo da comunidade científica com a excelência.
Referência:
Adam, D. (2024, October 15). The early days of peer review: five insights from historic reports. Nature. https://www.nature.com/articles/d41586-024-03287-4