A doença de Huntington, uma condição genética incurável e fatal que afeta progressivamente movimentos, equilíbrio e cognição, tem confundido cientistas e médicos por décadas, principalmente devido ao atraso no aparecimento de sintomas, geralmente entre os 30 e 50 anos. Recentemente, um estudo inovador oferece novas perspectivas sobre por que esse atraso ocorre, abrindo caminhos para potenciais tratamentos futuros. A pesquisa, publicada na revista Cell e destacada em Nature Medicine, ilumina o mecanismo pelo qual as mutações prejudiciais se acumulam silenciosamente por décadas nos neurônios antes de atingirem um limiar letal.
A doença de Huntington é causada por uma mutação no alelo do gene HTT, caracterizada pela repetição de três bases de DNA - citosina, adenina e guanina (CAG) - pelo menos 36 vezes. Os pesquisadores, incluindo neurocientista Sabina Berretta da Harvard Medical School e o geneticista Steven McCarroll do Broad Institute of MIT e Harvard, descobriram que enquanto a maioria dos neurônios mantém o número de repetições CAG com o qual nasceram, os neurônios da projeção estriatal - que são pensados para serem os primeiros a morrer na progressão da Huntington - acumulam muito mais repetições ao longo da vida.
Os neurônios podem acumular esses erros de repetição quando o DNA é separado para a formação do RNA, mas as duas fitas não se unem corretamente após o processo, criando um laço em um dos lados. Proteínas de reparo do DNA então tentam "corrigir" o problema, mas frequentemente adicionam sequências que não existiam anteriormente. Quando esses neurônios acumulam mais de 150 repetições CAG, eles passam por uma mudança drástica, perdendo sua identidade genética e ativando genes que promovem a morte celular.
Implicações para Tratamento
Este acúmulo lento de erros de CAG até um limiar fatal explica por que leva tanto tempo para os sintomas se manifestarem. Christopher Pearson, geneticista molecular humano do Hospital for Sick Children em Toronto, sugere que terapias que bloqueiem esse acúmulo de CAG poderiam retardar o início dos sintomas. Este estudo sugere que os tratamentos precisam começar o mais cedo possível, antes que um número significativo de neurônios da projeção estriatal morra.
Sarah Tabrizi, uma médica-cientista da University College London, reforça essa visão. Em um estudo publicado também em Nature Medicine, ela e sua equipe descobriram que jovens adultos com a doença de Huntington e quase sem sintomas visíveis já possuíam um número significativo de neurônios da projeção estriatal mortos devido ao acúmulo elevado de CAG. Isso indica que tratamentos precoces podem ser essenciais para salvar essas células críticas.
Os resultados deste estudo indicam que proteínas de reparo de DNA podem ser alvos promissores para o tratamento desta e de dezenas de outras desordens genéticas semelhantes. Berretta e colegas planejam expandir seus trabalhos para investigar se o acúmulo semelhante de CAG está afetando outros neurônios nos cérebros dos indivíduos com Huntington, potencialmente abrindo novos caminhos para intervenções terapêuticas.
Referência:
Mallapaty, S. (2025, January 17). Revealed: Why the fatal Huntington’s gene takes so long to cause harm. Nature. https://www.nature.com/articles/d41586-025-00119-x