Crianças que sobreviveram ao câncer enfrentam alto risco de doença renal crônica e hipertensão na vida adulta, revela estudo canadense
Conduzido por pesquisadores canadenses e publicado em JAMA Network Open em 19 de maio de 2025, o estudo revela um importante alerta: crianças que sobreviveram ao câncer apresentam risco significativamente maior de desenvolver doença renal crônica (DRC) e hipertensão até 27 anos após o tratamento. Essa constatação reforça a necessidade de diretrizes mais específicas e acionáveis para o acompanhamento de saúde renal e cardiovascular de sobreviventes do câncer infantil.
Com os avanços no tratamento do câncer pediátrico, a taxa de sobrevida aumentou consideravelmente nas últimas décadas. No entanto, a longevidade alcançada vem acompanhada de um fardo de complicações crônicas. Estudos prévios já indicavam que mais de 99% dos sobreviventes de câncer na infância desenvolvem ao menos uma condição crônica de saúde até os 50 anos.
Neste novo estudo, os pesquisadores analisaram dados administrativos de saúde da província de Ontário, no Canadá, para avaliar a incidência de DRC e hipertensão em sobreviventes do câncer infantil. Eles compararam os resultados com dois grupos controle: crianças previamente hospitalizadas por outras razões e uma coorte pediátrica da população geral.
Principais achados:
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Risco aumentado já no primeiro ano: As complicações renais e cardiovasculares surgiram precocemente, muitas vezes no primeiro ano após o fim do tratamento oncológico.
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Incidência acumulada de DRC: Foi observada uma taxa de 8% de DRC, embora os autores ressaltem que esse número pode ser subestimado por limitações nos dados administrativos utilizados.
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Hipertensão mais comum que DRC: Aproximadamente 15% dos sobreviventes desenvolveram hipertensão, uma condição ainda mais prevalente que a própria DRC, superando os índices encontrados nos grupos controle.
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Fatores de risco associados: Exposições a tratamentos como transplante de células-tronco, radioterapia e quimioterápicos nefrotóxicos (como cisplatina) aumentaram ainda mais o risco de DRC e hipertensão.
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Associação com complicações futuras: Mesmo formas leves de DRC na infância estão associadas a doenças cardiovasculares precoces, o que torna o diagnóstico e o acompanhamento ainda mais cruciais.
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Limitações das diretrizes atuais: A pesquisa também denuncia a falta de padronização e especificidade nas diretrizes internacionais de acompanhamento, especialmente no que se refere ao monitoramento renal (ex. albuminúria) e da pressão arterial.
Os autores propõem que os sobreviventes de câncer infantil sejam reconhecidos como grupo de alto risco cardiovascular e renal, demandando estratégias de prevenção primária e secundária mais agressivas. Eles recomendam o início precoce da triagem de DRC e hipertensão, além de acompanhamentos contínuos até a vida adulta.
Além disso, o estudo sugere que a harmonização entre as diretrizes de saúde renal pediátrica e as de seguimento oncológico de longo prazo pode criar um caminho mais claro para a vigilância clínica eficaz.
Os pesquisadores apontam limitações inerentes ao uso de dados administrativos — como a ausência de medidas laboratoriais diretas (como taxa de filtração glomerular e proteinúria) e a subnotificação de fatores como obesidade, história familiar ou tabagismo. No entanto, destacam que este é o maior estudo já realizado sobre o tema, o que confere relevância e solidez aos achados.
Para o futuro, sugerem estudos prospectivos com dados clínicos detalhados para:
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Identificar subgrupos de alto risco;
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Avaliar a associação entre episódios de lesão renal aguda e complicações crônicas;
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Investigar fatores de risco modificáveis que possam ser alvos de intervenção precoce.
Referência:
Lebel A, Chanchlani R, Cockovski V, et al. Chronic Kidney Disease or Hypertension After Childhood Cancer. JAMA Netw Open. 2025;8(5):e258199. doi:10.1001/jamanetworkopen.2025.8199