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SDRA COVID e não-COVID: gêmeos iguais de pais diferentes?

SDRA COVID e não-COVID: gêmeos iguais de pais diferentes?
Ana Carla Costa
set. 8 - 5 min de leitura
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A COVID-19 se apresenta, na maioria dos casos sintomáticos, sob a forma de um quadro respiratório agudo que, em 20 a 40% dos casos, pode evoluir para um quadro de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), caracterizado principalmente pela hipoxemia grave e pela presença de infiltrados pulmonares extensos.

Desde o início da pandemia, foram publicados vários editoriais e relatos de experiência que sugeriram que a SDRA do COVID-19 tem um comportamento atípico em relação a SDRA de outras etiologias, pois nela os pacientes com hipoxemia grave apresentavam complacência do sistema respiratório normal ou próximo do normal (Crs). Entretanto, ainda há controvérsias acerca disso, principalmente devido à escassez de trabalhos sobre o tema. 

Nesse âmbito, um estudo de coorte prospectivo, multicêntrico e observacional publicado em 29 de julho de 2020 no Intensive Care Medicine, avaliou pacientes diagnosticados com COVID-19, que evoluíram com SDRA e que estavam internados e sendo ventilados mecanicamente em hospitais da Espanha e Andorra no período entre 12 de março e 1 de junho de 2020. 

O principal objetivo desse estudo foi descrever as características clínicas de pacientes com SDRA induzida por SARS-CoV-2, o manejo ventilatório empregado e os resultados desses pacientes. Além disso, comparou-se os parâmetros respiratórios e os resultados de pacientes com SDRA COVID-19 e com SDRA de outras etiologias.

Para isso, avaliaram-se dados demográficos, sinais vitais, parâmetros laboratoriais, parâmetros ventilatórios, uso de terapias adjuvantes, tratamentos farmacológicos, cronologia da doença e escores Sequential Organ Failure Assessment (SOFA) e APACHE II. Também se relatou os pacientes que receberam alta da UTI, os pacientes que vieram a óbito e os que ainda estavam em tratamento na UTI em 1º de junho de 2020.

Foi observada predominância de pacientes idosos e de pacientes do sexo masculino com comorbidades (as mais frequentes foram hipertensão arterial e obesidade). O tempo médio de internação na UTI foi de 21 dias. A maioria (44,6%) dos pacientes tinha SDRA moderada. A porcentagem de pacientes com SDRA grave (38,1%) foi maior do que a encontrado em estudos em pacientes com SDRA não COVID-19. Em geral os pacientes foram tratados com volume corrente baixo e níveis moderados de PEEP de acordo com o padrão para proteção pulmonar (VC ≤ 8 ml / kg de PBW, Pplat <30 cmH 2 O e uma pressão motriz ≤ 15 cmH 2 O). Mais de 80% dos pacientes tinha baixa Crs, contudo, apesar da probabilidade de receber alta da UTI ter sido influenciada pela gravidade da SDRA, a mesma não foi influenciada pela Crs. Os valores de Crs, Pplat e pressão de direção foram muito semelhantes aos de pesquisas publicadas anteriormente sobre SDRA não COVID. 

As terapias adjuvantes, como manobras de recrutamento, posição prona e agentes bloqueadores neuromusculares foram usados em 79%, 76% e 72% dos pacientes, respectivamente. Esses achados também foram superiores a prática relatada em pacientes com SDRA grave não COVID-19. Um dos motivos para isso pode ter sido que, devido à carga de cuidados vivenciada pelos médicos durante o período do estudo, a estratégia ventilatória e o uso de terapias adjuvantes podem não ser representativas da prática clínica em circunstâncias não pandêmicas.

O principal motivo de admissão na UTI foi insuficiência respiratória aguda, embora os escores SOFA indicassem mais de uma disfunção orgânica (comprometimento hemodinâmico com necessidade de vasopressores foi a disfunção mais frequente). Tanto o tempo médio desde o início dos sintomas até a admissão hospitalar quanto a mortalidade em 28 dias foram semelhantes aos relatados em pacientes com SDRA não COVID.

Dentre as limitações, tem-se que o desenho de estudo não permitiu analisar a associação entre determinada estratégia ventilatória e o desfecho do pacientes; a análise de regressão de Cox não foi ajustada para fatores de confusão; e não coletou-se o número total de pacientes admitidos em UTI participantes durante o período do estudo.

Diante desses resultados foi possível observar que os pacientes com SDRA devido a COVID-19 apresentaram predominantemente uma SDRA típica, moderada a grave, e que, apesar do risco de mortalidade em 28 dias ter aumentado com a gravidade da SDRA, ele não foi maior do que outros estudos em pacientes com SDRA não COVID-19.

Este estudo, portanto, acrescentou informações relevantes em relação as principais características dos pacientes com SDRA COVID ventilados mecanicamente. Contudo, mais estudos são necessários para compreensão das formas de apresentação clínica da SDRA em COVID-19, de modo a proporcionar melhor elucidação sobre as estratégias de oxigenação e ventilação adequadas para minimizar a lesão pulmonar induzida pela ventilação.

    Texto elaborado pela Acadêmica de Medicina Ana Carla Costa

    Texto revisado pela Dra. Roberta Fittipaldi Palazzo


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    Referência:

    1. Ferrando, C., Suarez-Sipmann, F., Mellado-Artigas, R. et al. Clinical features, ventilatory management, and outcome of ARDS caused by COVID-19 are similar to other causes of ARDS. Intensive Care Med (2020). https://doi.org/10.1007/s00134-020-06192-2

     


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