Um dos estudos mais longevos e promissores sobre envelhecimento saudável e longevidade humana completou uma década de descobertas. Trata-se da CIAO Study — Cilento Initiative on Aging Outcomes, uma colaboração internacional que, desde 2016, investiga os fatores biológicos, psicológicos e sociais que possibilitam a extraordinária saúde de centenas de centenários residentes na região do Cilento, no sul da Itália.
Um laboratório vivo da longevidade
A região de Cilento, conhecida por ser a terra natal dos primeiros estudos sobre a dieta mediterrânea realizados por Ancel Keys, abriga cerca de 300 centenários em plena saúde física e mental. O local oferece um cenário único para os pesquisadores interessados em compreender os mecanismos que favorecem o envelhecimento com qualidade de vida.
O que a ciência descobriu até agora?
Durante os últimos dez anos, os pesquisadores do CIAO vêm utilizando ferramentas avançadas para investigar os marcadores biológicos e sociais da longevidade. As abordagens vão desde análises genéticas, epigenéticas, transcriptômicas e proteômicas até modelagens com organoides humanos derivados de células-tronco pluripotentes induzidas (iPSC).
A seguir, resumimos os principais achados apresentados pela equipe internacional de cientistas:
1. Microcirculação superior em centenários
Logo no início do estudo, em 2016, foi observado que os participantes mais velhos apresentavam microcirculação sanguínea tão eficiente quanto a de pessoas 30 anos mais jovens. Níveis baixos de adrenomedulina, um peptídeo envolvido na regulação vascular, foram apontados como marcador de boa circulação.
2. Saúde mental preservada apesar da idade
Em 2018, ao comparar 29 nonagenários com familiares de meia-idade, constatou-se que os mais velhos tinham pior condição física, mas melhor bem-estar mental. Eles demonstravam maior resiliência, otimismo e conexões sociais, com forte vínculo com a terra, a espiritualidade e a família — elementos que proporcionavam propósito de vida.
3. Perfil cardiovascular surpreendente
Em 2020, análises de marcadores cardiovasculares em centenários e seus coabitantes mais jovens mostraram que os mais velhos, mesmo sem uso frequente de estatinas, tinham níveis mais baixos de glicose em jejum e LDL, além de menos doenças cardiovasculares sintomáticas, mesmo entre aqueles com alterações estruturais cardíacas.
4. Função cognitiva mantida
Ainda em 2020, um estudo neurocognitivo revelou que os centenários do Cilento apresentavam desempenho cognitivo comparável ao de residentes entre 50 e 75 anos. Nenhuma diferença significativa foi encontrada nos marcadores de estresse oxidativo ou na presença do alelo APOE, conhecido por aumentar o risco de Alzheimer. Os autores sugerem que a dieta mediterrânea e características de personalidade positivas são fatores protetores.
5. Sabedoria como antídoto para a solidão
Outro achado relevante foi a relação inversa entre sabedoria e solidão. Utilizando escalas validadas em San Diego e no Cilento, os cientistas observaram que níveis mais altos de sabedoria correlacionavam-se com melhor qualidade do sono, mais felicidade e melhor saúde geral, mesmo quando os níveis de solidão não variavam significativamente entre os grupos.
Colaboração global e ciência de ponta
A pesquisa CIAO é fruto da colaboração entre diversas instituições de prestígio, como a Sanford Burnham Prebys (EUA), o Sanford Stem Cell Institute da Universidade da Califórnia em San Diego, a Universidade La Sapienza de Roma e a Great Health Science, rede de instituições públicas e privadas italianas.
Segundo o Dr. Salvatore Di Somma, líder da pesquisa na Itália, "não existe um único segredo para uma vida longa e saudável, mas muitos, que agora começamos a entender". Já o Dr. David Brenner, da Sanford Burnham Prebys, enfatiza que “com tecnologias emergentes e colaborações globais, avançamos muito — e o futuro promete ainda mais descobertas”.
Avanços promissores com células-tronco e organoides
Um dos projetos em destaque hoje usa organoides humanos derivados de centenários para simular estresses metabólicos e do envelhecimento. Essa abordagem inovadora, apoiada pelo Sanford Stem Cell Institute, pode abrir portas para estratégias regenerativas de tratamento de doenças relacionadas à idade.
O que vem a seguir?
Nos dias 22 e 23 de maio, os pesquisadores se reunirão em Acciaroli (Pollica-Cilento), na Itália, para o simpósio "CIAO Study: A decade of science on healthy aging, stem cells and the revealed secrets of longevity", com o objetivo de avaliar a jornada científica até aqui e estabelecer os próximos passos da pesquisa para a próxima década.