Paciente com câncer pensa em Suicídio?
Dia 10 de setembro é o Dia Mundial de Prevenção Ao Suicídio, o que promove inúmeras ações com intuito de identificar precocemente pessoas com risco de atentarem contra a própria vida. O processo de diagnóstico de câncer pode ser repleto de estigmas e fatores causadores de estresse, assim como tratamentos agressivos utilizados podem levar o paciente a danos físicos e emocionais, através de perda de partes do corpo e da auto-imagem, efeitos colaterais impactantes e mudanças irreversíveis nas atividades do dia a dia do paciente. Deste modo, não surpreende que a ocorrência de transtornos psiquiátricos nessa população esteja acima das taxas observadas da população em geral (Manjulika Das, 2019), de tal modo que a Sociedade Americana de Oncologia - ASCO - considera estresse emocional e ansiedade como sinais vitais a serem avaliados nos pacientes com câncer (Andersen et al, 2014).
Pelo menos 30% desses pacientes possuem algum transtorno psiquiátrico (com essa cifra podendo chegar até 85% em diferentes estudos) entre depressão, transtornos de ansiedade e de adaptação/ajustamento, e este é um dos fatores de risco associados a uma incidência 2 vezes maior de tentativas de suicídio, e de 2 a 13 vezes maior de morte por suicídio do que a população em geral (Wang et al, 2017).
Estudos retrospectivos recentes identificaram que o primeiro ano após o diagnóstico é o período de maior risco de tentativa e óbito por suicídio. A primeira semana pós o diagnóstico é a mais delicada, sendo o risco de morte por suicídio nesse período cerca de 13 vezes maior do que a população em geral. Muitos desses pacientes não chegam a ter real noção das possibilidades de tratamento e prognóstico, pois nem se quer tem a primeira consulta com oncologista. Conforme o tratamento avança, esse risco reduz, e após um ano fica mais próximo da população em geral, mas ainda assim 2x superior. E esse risco pode manter-se por até 25 anos (Wang et al, 2017; Robson et al, 2010).
Além do diagnóstico, efeitos colaterais do tratamento podem afetar a disposição e o humor do paciente, inclusive com confusão entre o que é sintoma emocional e o que é efeito colateral, como períodos prolongados de astenia intensa, náuseas persistentes, inapetência, insônia, disfunção sexual e anedonia. Períodos de troca de esquema de tratamento também são associados a aumento tanto no risco de suicídio quanto na piora de transtornos psiquiátricos.
Outros fatores de risco associados ao suicídio são (Robson et al, 2010):
- Sexo masculino;
- Idade avançada;
- Tumores de pulmão, cabeça e pescoço e testículo/bexiga;
- Prejuízo físico importante (decorrentes do próprio tumor, de procedimentos cirúrgicos ou de tratamentos);
- Sintomas mal controlados;
- Pior prognóstico;
A atenção a saúde mental desses pacientes deve, então, receber atenção especial. A ASCO sugere que periodicamente os pacientes sejam avaliados utilizando protocolos validados, como por exemplo o PHQ-9, que possui inclusive tradução validada para o português (Santos et al, 2013), e pode ser preenchido tanto pelo paciente quanto pelo entrevistador. Não é necessário, porém, que esse protocolo torne-se mais uma check-list a ser realizada em toda consulta, e sim, que as perguntas relacionadas ao estado emocional sejam mencionadas, e caso necessário, o protocolo utilizado como mecanismo de triagem para acompanhamento especializado, psicológico ou psiquiátrico.
O mais importante é unirmos esforços para tentarmos minimizar os impactos físicos e emocionais do câncer na vida do paciente, utilizando todos os nossos arsenais terapêuticos, sejam cirúrgicos, medicamentosos, psicoterápicos, alternativos, enfim, prevendo a ocorrência de transtornos complicados, acolhendo os sofrimentos e evitando ao máximo que esse risco aumentado de mortes por suicídio em pacientes com câncer, torne-se uma triste realidade.
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