Um estudo clínico randomizado conduzido no Canadá revela que duas doses da vacina quadrivalente contra o HPV (4vHPV), administradas com 6 meses de intervalo, oferecem proteção quase completa contra infecção persistente pelos tipos 16 e 18 do vírus, os mais oncogênicos por até 13 anos após a primeira dose.
A pesquisa, parte do ensaio clínico ICI-VPH (Impact of HPV Immunization Schedules Against HPV), acompanhou 3.356 meninas vacinadas entre 9 e 11 anos, dentro do programa escolar de vacinação do Québec, no Canadá. Os resultados reforçam a efetividade da imunização precoce e questionam a necessidade de uma terceira dose de reforço cinco anos após as primeiras aplicações.
Principais achados:
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Proteção duradoura: Apenas uma infecção persistente por HPV-16 ou HPV-18 foi detectada ao longo de até 13 anos de seguimento, o que impossibilitou a realização de uma análise estatística de não inferioridade, por falta de casos, mas reforça a eficácia da estratégia de duas doses.
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Baixa incidência de infecção: Foram observadas apenas 23 infecções incidentes pelos tipos 16 e 18 ao longo do estudo e somente cinco casos nos exames finais. Além disso, foram detectadas apenas oito infecções pelos tipos 6 e 11, associados à maioria das verrugas genitais, o que indica proteção também contra essas manifestações clínicas.
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Reforço pode ser desnecessário: A comparação entre o esquema de duas doses (0 e 6 meses) e o de duas doses + reforço (0, 6 e 60 meses) não mostrou benefício adicional relevante do reforço tardio. Isso sugere que, com duas doses administradas na infância, o risco de infecção persistente pelo HPV é extremamente baixo mesmo sem reforço.
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Evidências alinhadas com estudos anteriores: Os resultados confirmam dados observacionais e estudos conduzidos na Índia e em outras regiões, que também relataram baixíssimas taxas de infecção persistente por HPV-16/18 com 1, 2 ou 3 doses da vacina.
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Contexto real de saúde pública: O estudo foi realizado em um cenário populacional real, com vacinação realizada em ambiente escolar, alta adesão e participantes que estavam em idade pré-exposição ao HPV, o que confere ainda mais robustez às conclusões.
Implicações:
Os achados impactam diretamente as diretrizes de imunização em saúde pública. A Comissão de Imunização de Québec e o Comitê Nacional de Imunização do Canadá já recomendam a adoção de um esquema de dose única, sustentados por estudos que mostram eficácia de até 12 anos com uma só aplicação.
A substituição da 4vHPV pela vacina nonavalente (9vHPV), que também protege contra os tipos 52 e 58, comuns no estudo, pode ampliar ainda mais a cobertura de proteção. No entanto, como a tecnologia e a resposta imune das vacinas 4vHPV e 9vHPV são semelhantes, os resultados encontrados podem ser extrapolados com segurança para os esquemas atuais.
Além disso, a baixa incidência de infecção pelos tipos 6 e 11 reforça a prevenção contra verrugas genitais e doenças não malignas causadas pelo HPV.
Apesar de não ter sido possível realizar a análise de não inferioridade estatística, a ausência de casos clínicos relevantes de infecção persistente é, por si só, uma evidência do sucesso do programa. O estudo também enfrentou desafios de recrutamento e sofreu uma pausa de seis meses durante a pandemia de COVID-19, mas manteve rigor metodológico, com análise laboratorial cega e adesão elevada aos protocolos.
Referência:
Sauvageau C, Mayrand M, Ouakki M, et al. Protection Against Persistent HPV-16/18 Infection After Different Number of Doses of Quadrivalent Vaccine in Girls and Young Women: A Randomized Clinical Trial. JAMA Netw Open. 2025;8(7):e2519095. doi:10.1001/jamanetworkopen.2025.19095