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Impasses na implementação do Monitoramento Remoto do Paciente

Impasses na implementação do Monitoramento Remoto do Paciente
Albert Bacelar de Sousa
jan. 11 - 7 min de leitura
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O Monitoramento Remoto do Paciente (MRP) é um conjunto de dados clínicos coletados fora do padrão convencional do cuidado para um cuidador, que pode ser um hospital/clínica ou um profissional de saúde. Esse processo inclui a coleta e a filtração de dados, a análise dos dados e a geração dos gatilhos (ou alertas) para tomada de decisão. Ele possibilita ainda um aumento na abrangência geográfica, pesquisa clínica em condições habituais de vida, melhor qualidade no cuidado e redução dos custos no médio prazo.

Na visão macro, o MRP será possível numa escala maior e mais barata com o avanço da tecnologia e maior uso, assim como todo equipamento ou dispositivo com o passar do tempo. Algumas pulseiras, smartphones, relógios, sensores e outros gadgets já fazem algum tipo de monitorização, ainda que limitados e sem integração de comunicação entre os mesmos.

O envelhecimento populacional, o aumento na população cronicamente enferma, o melhor cuidado com as comorbidades e a necessidade de melhor performance física e mental em atividades diárias e de esportes vêm fornecendo a necessidade que o mercado, os investidores e os criadores do setor precisam.

Considerando os pacientes, os profissionais de saúde e o mercado, existem alguns pontos a serem questionados para avaliar o sucesso do MRP:

a) A medida é tecnicamente plausível? (Se não, o MRP não funcionará!)

É possível monitorizar todos os dados relacionados a uma determinada doença ou síndrome de forma efetiva e sem erros de mensuração, evitando falsos-negativos ou falsos-positivos? Sempre surgirá uma melhor versão de um determinado dispositivo, permanecendo mais caro a cada nova versão. Não há uma previsão desse racional acabar a longo prazo, pois é fácil comparar com a evolução dos smartphones e smartTVs.

Ainda é necessário avaliar se a medida enquanto se toma banho, dorme ou pratica alguma atividade física vai ter o mesmo grau de assertividade na coleta dos dados. A participação dos grandes players do mercado da tecnologia, como Google e Apple, dada sua capacidade de reprodutibilidade e resolução de problemas, atenuariam na perda de qualidade na coleta das informações em diferentes cenários, mas não anulariam por completo o problema.

Esses mesmos dispositivos estariam mais susceptíveis à interferência de outros dispositivos, bem como ataques maliciosos com diferentes objetivos. Assim como vendemos nossos dispositivos ultrapassados para adquirir novas versões, seria viável vendermos esses gadgets?

Não menos importante, a forma como pode ser clusterizado em níveis de informação é fundamental. Por exemplo, não vejo necessidade de um técnico que vai aplicar uma vacina saber se tenho uma determinada doença. E por último, como poderia ser auditado a qualidade da coleta desses dados real-time do ponto de vista clínico?

b) A medida é clinicamente relevante? (Se não, os profissionais de saúde ignorarão!)

Na área de saúde nem todos os dados analisados ao mesmo tempo ajudam na condução do paciente, por vezes gerando um fator de confusão no diagnóstico diferencial e na tomada de decisão. Sensores e gadgets cada vez menores e menos perceptíveis vão colher maiores quantidades de dados (dos mesmos dados em diferentes períodos e de diferentes tipos de dados), mas levar em consideração, por exemplo, um aumento de temperatura corporal e frequência cardíaca enquanto se sobe uma escada em um antigo prédio pode ligar alerta de Sepse.

Outro exemplo, sabemos que uma Pressão Arterial Média de 65mmHg em um paciente grave em uma Unidade de Terapia Intensiva é muitas vezes almejado. Porém, em um mesmo paciente deitado em sua cama em casa pode ser deletério.

O excesso de dados pode abrir margem para preencher critérios de uma doença ou síndrome que o paciente na realidade não tem. Em um momento que vivemos de ansiedade social coletiva, uma preocupação seria o surgimento de um novo esgotamento mental. Assim como a Síndrome de Burnout para o trabalho, haveria algum esgotamento mental pelo excesso de preenchimento de critérios para doenças e pela “busca da cura”, principalmente nos ansiosos e nos que ainda não se descobriram hipocondríacos.

Há uma esperança de que possamos dizer melhor qual seriam os parâmetros normais para diferentes grupos de pessoas. Com o uso mais disseminado (amostra populacional maior) e mais prolongado dos dispositivos seria possível discriminar qual seria o intervalo normal (fisiológico) de cada indivíduo, e não mais considerar o indivíduo em uma curva Gausiana. Provavelmente haverá a necessidade de um time para cuidar de uma característica nova ou antiga que está em tendência para uma patologia ou perda na qualidade de vida. Com médicos cada vez “mais especialistas”, um grupo destinado à análise das tendências será necessário.

c) O custo se faz necessário? Existe rentabilidade? O custo-benefício vale? (Se não, não se pode dar o luxo da sua implantação!)

Quando se lê sobre finanças, é comum encontrar que o MRP reduz a taxa de readmissão hospitalar, mas será mesmo? O retorno sobre investimento (ROI) é calculado com a diferença entre o que foi ganho como resultado e o custo do programa em relação ao custo do programa. Como entraria no custo do programa despesas como inscrição/retenção de pacientes, dos profissionais de saúde, de serviços integrados e das tecnologias relacionadas? É possível contabilizar os ganhos de eficácia?

Claro que esse tipo de pergunta não cabe somente à área de tecnologia e saúde. É uma dúvida inerente a todos os outros setores do mercado. Porém, em se tratando de uma área relativamente nova, não temos precedentes nas linhas econômica e financeira para um cálculo adequado. É possível que uma mesma tecnologia possa se estender para outros pacientes e patologias? O objetivo do core business realmente se baseia em qualidade, custo, recurso e necessidade do mercado?

Há um gap quando discutimos os benefícios concretos de curto, médio e longo prazo da MRP. Uma vez que monitorizar tudo ao mesmo tempo por tempo indeterminado seria absurdamente custoso e desnecessário, como será oferecido a melhor opção de “pacotes” para cada paciente? Assim como o mercado atual em todos os segmentos, em que temos as mais diversas categorias de serviços, os modelos terceirizados, prontos para uso ou mistos atenderiam melhor às nossas necessidades? Em um modelo de harmonização de diversos serviços em um só, como seria essa união entre qualidade clínica, segurança do paciente, experiência do paciente, engajamento do paciente, telemedicina, clínicas físicas e iniciativas públicas na saúde?

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