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MANIFESTO EM DEFESA DA SAÚDE PÚBLICA

MANIFESTO EM DEFESA DA SAÚDE PÚBLICA
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jul. 27 - 10 min de leitura
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Fonte: Conselho Federal de Medicina

A grave situação enfrentada pela saúde pública no estado do Rio de Janeiro é o exemplo mais recente da crise que afeta a rede pública de assistência em todo o País. Inconformados com o desamparo e o abandono dos cidadãos e dos profissionais, e indignados com a ausência de respostas concretas oferecidas pelos gestores federais, estaduais e municipais, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) vêm a público denunciar que:
 
1) diante dos inúmeros relatos de problemas na oferta de assistência a saúde para a população brasileira, nos diferentes níveis de complexidade, conforme extensas e sucessivas denúncias divulgadas pela imprensa e pelos órgãos de fiscalização e controle não apenas no Rio de Janeiro, mas em todo o território nacional, agirão de forma proativa na defesa dos direitos individuais e humanos;
 
2) os esforços desencadeados têm como base as prerrogativas legais do CFM e dos CRMs, que atuarão nas esferas judiciais e extrajudiciais, inclusive em fóruns internacionais, buscando levar os gestores dos serviços prejudicados a tomarem as medidas necessárias à normalização dos atendimentos, bem como a sua responsabilização legal em casos de irregularidade;

3) as reinvindicações dos Conselhos de Medicina terão como foco a ampliação do acesso da população ao atendimento; a manutenção de condições dignas para o acolhimento dos pacientes e para o trabalho dos médicos e demais profissionais da saúde; a melhora da qualidade dos serviços realizados; o uso racional dos recursos públicos, bem como a ampliação da participação do Estado no financiamento das despesas em saúde; e a busca de uma gestão eficiente e transparente;

4) a população tem no CFM e nos CRMs parceiros com os quais pode contar para garantir seus direitos constitucionais, conforme expressos na Carta Magna de 1988; assim como os médicos têm suporte do CFM e dos CRMs para reivindicar condições mínimas para o ético exercício profissional, evitando-se a sobrecarga e os excessos cometidos pela gestão, que tem muitas vezes transferido para esse grupo de profissionais a responsabilidade pelas falhas da rede pública.

O risco de comprometimento e de falência do Sistema Único de Saúde (SUS), como recentemente registrado no Rio de Janeiro e em outras localidades do País, não pode ser ignorado pelas autoridades e pela sociedade brasileira. Cabe a todos, inclusive aos representantes dos médicos, buscar uma solução definitiva para esses problemas, que têm causado graves transtornos e até mortes evitáveis.
 
O CFM e os CRMs estão do mesmo lado da população e dos médicos brasileiros: o lado de quem defende a saúde e a medicina de qualidade.


Brasília (DF), 19 de julho de 2017.
  

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA
CONSELHOS REGIONAIS DE MEDICINA

Falta de leitos – Para os conselheiros, um dos grandes gargalos atuais do SUS está na oferta limitada de leitos para internação. Em cinco anos (de 2010 a 2015), o Brasil perdeu 23,6 mil unidades desse tipo - destinados a pacientes que precisam permanecer num hospital por mais de 24 horas. O total baixou de 335,5 mil para 312 mil, no período, o que representa uma queda de 13 leitos por dia. O cálculo foi feito com base em informações do próprio Ministério da Saúde.

Para o presidente do CFM, está situação atrasa diagnósticos e tratamentos e, consequentemente, provoca aumento nas taxas de morbidade (adoecimento) e de mortalidade. Outro efeito colateral dessa redução de leitos está na sobrecarga nos serviços de urgência e emergência (prontos-socorros e prontos-atendimentos). “Há milhares de pacientes que, sem acesso aos serviços, lotam as salas de espera aguardando para fazer uma cirurgia ou pelo menos receber um cuidado, uma medicação, que alivie uma crise aguda, mas que não traz a solução definitiva para seu problema de saúde”, explica.

Psiquiatria, pediatria cirúrgica, obstetrícia e cirurgia geral são as especialidades que mais sofreram o impacto do fechamento dos leitos de internação, em nível nacional. “Na realidade atual, só resta ao usuário do SUS rezar para não adoecer, não precisar de internação hospitalar. Mas, como a doença não avisa, as filas de espera não param de crescer e o que vemos são doentes fragilizados, se acumulando em cadeiras e macas improvisadas nos corredores dos prontos-socorros”, lamenta o 1º secretário do CFM, Hermann Tiesenhausen.

Em números absolutos, os estados das regiões Sudeste e Nordeste foram os que mais sofreram redução no período. Só no Rio de Janeiro, por exemplo, pouco mais de sete mil leitos foram desativados no período. Na sequência, aparece Minas Gerais (-3.241 leitos) e São Paulo (-2.908). No Nordeste, a Bahia sofreu o maior corte (-2.126). Entre as capitais, foram os fluminenses os que mais perderam leitos na rede pública (-2.503), seguidos pelos fortalezenses (-854) e brasilienses (-807).

Terapia Intensiva -  Também foi denunciado pelos Conselhos de Medicina que apenas 505 municípios brasileiros possuemUnidades de Terapia Intensiva (UTI) no Brasil, ou seja, 10% do total. Isso deixa sem esse tipo de cobertura os moradores de 5.065 cidades. “Todos os dias nós, médicos, testemunhamos a morte de pessoas que poderiam ser salvas pela disponibilidade de um leito de UTI. Para os governos, quando um paciente morre, trata-se apenas de mais um número. Para a família, no entanto, é uma tragédia”, critica Mauro Ribeiro, 1º vice-presidente do CFM.

Segundo o levantamento do CFM, em 70% dos estados não há o número de leitos de UTI preconizado pelo Ministério da Saúde para garantir o bom atendimento de sua população. De acordo com a Portaria Ministerial nº 1.101/2002, deve existir de 2,5 a 3 leitos hospitalares por cada 1 mil habitantes. Já a oferta necessária de leitos de UTI deve ficar entre 4% e 10% do total de leitos hospitalares, o que corresponde a um índice de um a três leitos de UTI para cada 10 mil habitantes. Se consideradas as unidades públicas, o SUS conta com 0,95 leitos de UTI para cada grupo de 10 mil habitantes.

Em 19 unidades da federação, o índice de UTI por habitante na rede pública é inferior ao preconizado pelo próprio Ministério – todos os estados das regiões Norte (exceto Rondônia), Nordeste (exceto Pernambuco e Sergipe) e Centro-Oeste, além do Rio de Janeiro e Santa Catarina. No Acre, Roraima, Amapá e Maranhão o índice permanece abaixo do ideal mesmo se considerados os leitos privados disponíveis nestes estados.

A má distribuição geográfica dos leitos também é um agravante. Só o Sudeste concentra 47% das UTIs brasileiras disponíveis no SUS. Já o Norte tem a menor proporção: apenas 2.058 5,7%. Os dados revelam ainda que os sete estados da região Norte possuem juntos menos leitos de UTI no SUS do que todo o estado do Rio de Janeiro: 1.141 e 1.289, respectivamente.

Na avaliação de Mauro Ribeiro, o lado mais desumano e perverso dentro do caos que assola a saúde pública no Brasil está na falta de leitos de UTI, onde pacientes entubados em ventiladores improvisados morrem de causas evitáveis. “Por mais que os médicos e toda a equipe multiprofissional se dediquem a salvá-los, esses pacientes não estão onde deveriam estar. A gama instrumental de uma UTI, aliada à capacidade da equipe que atua nela, permite que muitas pessoas sejam salvas”, afirmou Ribeiro.

Sem conseguir acesso aos leitos, pacientes e seus familiares recorrem à Justiça. Informações do Ministério da Saúde revelam que o gasto governamental decorrente de ações judiciais que exigem, principalmente, um leito de UTI e medicamentos de alto custo, atingiu a cifra de R$ 838,4 milhões somente em 2014.

 

Subfinanciamento – Todas as denúncias e números negativos apresentados pelos Conselhos de Medicina têm origem na má gestão e no baixo comprometimento do Estado com as despesas em saúde no País. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em seu último relatório (divulgado em junho), o Brasil é terceiro pior das Américas em termos de gastos públicos com a área. Os dados revelam que, em 2014, apenas 6,8% do orçamento público brasileiro foi destinado à saúde, sendo a terceira pior taxa entre os 35 países que compõem os continentes americanos – a frente apenas do Haiti e da Venezuela e abaixo da média mundial (11,7%).

O levantamento da OMS aponta que, ao longo dos anos, o percentual gasto pelo Governo com saúde no Brasil oscilou entre 4,1% (2000) e 9,9% (2010), incluindo as três esferas de gestão (União, Estados e Municípios). Atualmente, a taxa brasileira é também inferior à média do que se gasta na África (9,9%), dividindo a posição no ranking com Gana, Tajiquistão, Omã e Mongólia.

Análise do Conselho Federal de Medicina (CFM) mostra ainda que, entre 2003 e 2016, o Ministério da Saúde (MS) deixou de aplicar cerca de R$ 155 bilhões no SUS. No período apurado, cerca de R$ 1,5 trilhão foi autorizado para o Ministério da Saúde no Orçamento Geral da União (OGU), segundo os dados oficiais do próprio Governo. Os desembolsos, no entanto, foram de R$ 1,3 trilhão (89% do previsto). Desse montante “devolvido” pelo Ministério da Saúde, quase um terço (R$ 66,4 bilhões) se refere a verba que seria destinada a investimentos, como construções e reformas ou compra de equipamentos.


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