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Telemedicina: uma análise descritiva acerca de sua regulamentação

Telemedicina: uma análise descritiva acerca de sua regulamentação
Fernando Antônio Ramos Schramm Neto
mar. 22 - 13 min de leitura
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Telemedicina constitui-se como uma dos pilares que sustentam a base para a construção do futuro da Medicina. Ela se fundamenta na utilização dos meios e tecnologias da telecomunicação e informação, visando oferecer melhorias e aumento da qualidade do fornecimento de conhecimento e da atenção médica prestada aos seus pacientes. Seja na área da prevenção de doenças, bem como para simples exames de rotina, a telemedicina está presente, auxiliando a disseminação de informações para prevenção, tratamento, controle e monitoramento de doenças, deficiências, traumas e outras condições médicas.

Sua abrangência, nos dias atuais, ultrapassa limites, englobando hospitais, postos de saúde, serviços ambulatoriais e tantos outros locais voltados ao tratamento e à terapêutica. Sua importância é tanta, que é utilizada em larga escala, inclusive, no auxílio voltado à bases médicas e militares localizadas em regiões inóspitas ou que passaram por desastres recentes e requerem auxílio.

Exemplos são o terremoto que assolou o Haiti, em 2010, e o os desastres sísmicos e nucleares ocorridos no Japão, em 2011. Com a telemedicina, o auxílio em saúde se fez de maneira mais rápida, podendo chegar aos mais diversos locais de abrangência e tratamento de doentes, no tempo mais rápido possível, a partir do compartilhamento de informações.

No Brasil, a telemedicina se faz presente desde os anos de 1990, onde foi introduzida juntamente com a “Revolução da Saúde”, implantada no país ao longo deste período, no entanto, foi apenas na primeira década do século XXI que tal tecnologia pode de fato se fazer efetiva nos centros hospitalares, com a chegada da internet.

A diferença entre a Telemedicina e os outros conceitos

É importante diferenciar telemedicina de outros conceitos que foram abraçados pela área da saúde, nos últimos tempos.

Um exemplo é a telessaúde, que, apesar de também fazer uso das tecnologias atuais para ofertar uma melhor qualidade de tratamento e informações para profissionais médicos e pacientes, ela engloba a telemedicina, pois é um conceito mais universal, abrangendo desde serviços de teleducação, até redes de investigação de epidemiologias regionais.

Outro conceito bastante inovador, popularizado nos últimos tempos a partir da chegada da “Medicina humanizada” é a e-saúde, ou simplesmente saúde digital, que foi proposto pela Organização Mundial da Saúde com o objetivo de unificar as informações que dizem respeito e interessam aos pacientes, como medicamentos, tratamentos, cirurgias, dentre outras.

No entanto, em nosso país, inúmeros órgãos tentaram modernizar e aumentar o conceito da telemedicina, por meio da divulgação de resoluções que tentavam abranger o tema, visando facilitar e tornar o acesso às informações de saúde, por parte dos profissionais da Medicina, mais comum.

Um exemplo foi a Resolução n° 2.227/18, proposta pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em fevereiro de 2019. Tal documento foi elaborado como resultado de inúmeros debates entre especialistas, fundamentada em princípios éticos, e que consideravam as dificuldades dos profissionais ao longo de seu dia a dia. Contudo, a norma acabou causando polêmica e respostas de inúmeras entidades da área médica, que buscavam, de alguma forma, contribuir com seus registros, portanto, acabou sendo revogada poucos dias após sua publicação.

A Resolução n° 2.227/18 basicamente definia o conceito de telemedicina, como o exercício da medicina mediado por tecnologias que promovessem avanços e inovações nas áreas da educação, assistência à saúde, dentre outras. Além disso, o documento também previa as ações de teleconsulta (consulta médica remota, com o auxílio de tecnologias), telediagnóstico (transmissão de registros, gráficos e imagens para emissão do laudo ou parecer do médico), telecirurgia (realização de cirurgias em locais remotos, com o auxílio de tecnologias específicas, a exemplo de robôs cirurgiões), teleconferência, teleconsultoria, dentre outros, que não estavam presentes na resolução anteriormente divulgada pelo mesmo Conselho Federal de Medicina, a de n° 1643/02.

Por que a Telemedicina?

Segundo o próprio CFM, “além de levar saúde de qualidade a cidades do interior do Brasil, que nem sempre conseguem atrair médicos, a telemedicina também beneficia grandes centros, pois reduz o estrangulamento no sistema convencional causado pela grande demanda, ocasionada pela migração de pacientes em busca de tratamento”.

Contudo, enquanto isso, ainda segue em vigor a antiga resolução n°1643/02, que exige qualidade de infraestrutura e qualificação para os profissionais de saúde que exercerão a telemedicina.

Além disso, ela também aborda a respeito do conceito de telemedicina de uma maneira menos abrangente e mais limitada do que a n° 2.227/18, afirmando que embora seja o exercício da medicina a partir da utilização de metodologias ativas, de telecomunicação e audiovisual, apenas destinava sua finalidade para educação, pesquisa e assistência, sem abranger as áreas da prevenção, promoção e estudo de lesões geradas por doenças, como a Resolução mais moderna.

Somado a isso, ela também estabelecia que o pleno exercício da prática da telemedicina deveria obedecer normas técnicas impostas pelo próprio CFM, pertinentes à guarda, confidencialidade e cuidados ao transmitir documentos relacionados ao paciente.

A atuação da ANS

Outros órgãos se destacam por estarem constantemente abordando e divulgando informações, documentos e novos planos para sustentar o conceito e a aplicação da telemedicina em território nacional. Um deles é a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que é conhecida por seus constantes posicionamentos acerca da utilização da telemedicina.

Um exemplo foi o debate ocorrido entre tal órgão e a Associação Médica Brasileira, que enviou um ofício discorrendo acerca da utilização de teleconsultas, onde dizia que a “utilização temerária e sem o devido amparo legal de aplicativos de comunicação para a realização de consultas a distância”.

Outro exemplo foi durante a entrevista prestada pelo ex-presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN), doutor Ronald de Lucena Farias, à própria SBN, que afirmou:

A Agência Nacional de Saúde (ANS) aprofundou os processos de regulamentação das juntas de arbitramento. Elas foram criadas para diminuir conflitos entre médicos, pacientes e operadoras de saúde. Pelas novos regulamentos da ANS, essas juntas de arbitramento vão se tornar obrigatórias. Elas ficam localizadas em grandes centros, dando apoio a outros locais mais remotos do Brasil. Se houver um conflito em João Pessoa ou Cuiabá, por exemplo, vai existir um médico presencial para julgar essa questão, mas com suporte de outra junta com pelos menos três médicos, localizados em centros maiores. Mas tudo tem de ser feito de acordo com a regulamentação do CFM, para garantir o sigilo e integridade das informações”.

Isso tornou clara a participação da ASN na regulamentação e efetivação da telemedicina.

Recentemente, foi realizada uma reunião da Diretoria Colegiada da ASN, que, considerando a atual crise desencadeada pela pandemia de coronavírus, definiu novas medidas e regras para que as operadoras utilizassem a telemedicina, a exemplo da prorrogação dos prazos máximos de atendimento para realização de consultas, exames, cirurgias e terapias que não fossem urgentes.

A própria ANS iria fiscalizar e reavaliar a medida periodicamente, podendo fazer quaisquer tipos de alterações. Sobre a telemedicina propriamente dita, a ANS recomendou que as operadoras adequassem suas redes visando adaptar e proporcionar atendimento remoto através dos recursos de tecnologia, para abranger o maior número possível de pacientes.

O que o Ministério da Saúde tem feito?

Outras normas importantes foram estabelecidas pelo Governo, por meio do Ministério da Saúde, sendo uma das principais a Portaria MS n° 2.546/11. Esta Portaria aborda, como um de seus temas principais, a respeito do Programa Nacional Telessaúde Brasil Redes, sendo essa uma iniciativa que visa estabelecer regras e diretrizes para empresas que visam apresentar ofertas de telediagnóstico para unidades de saúde do SUS.

Segundo o próprio documento, tal Programa fornece aos profissionais e determinados trabalhadores das redes de saúde do SUS, os seguintes serviços:

  • Teleconsultoria: consiste numa consulta que é registrada e realizada por profissionais e gestores da área de saúde, fazendo uso de uma instrumentação específica “bidirecional”, que permita a conexão de ambos os profissionais, tendo como objetivo principal o esclarecimento de dúvidas e questões relacionadas com a administração da área de saúde, englobando procedimentos clínicos e ações diagnósticas. Segundo o documento, essa teleconsultoria pode ainda ser síncrona (realizada em tempo real), ou assíncrona (através de mensagens off-line).
  • Telediagnóstico: que se configura como um serviço de atendimento autônomo entre profissionais, em que se é esclarecido o diagnóstico, juntamente com informações relevantes que permitam se chegar ao resultado de uma determinada doença que aflige um necessitado.
  • Segunda Opinião Formativa: uma resposta e busca por resultados organizados e específicos para determinados temas, fundamentados nas melhores e mais confiáveis evidências científicas, a perguntas originadas das teleconsultorias, e selecionadas de acordo com alguns critérios estabelecidos pelo próprio SUS.
  • Tele-Educação: um conjunto de serviços, como conferências, aulas, reuniões e palestras, visando distribuir conhecimento acerca dos mais diferentes temas da área da saúde.

Outras características mais específicas do modelo de funcionamento do Programa Nacional Telessaúde Brasil Redes estão expostas em outro documento divulgado pelo próprio Ministério da Saúde, em 2015, denominado de Nota Técnica 50. Nele, ficam claras as diretrizes e dogmas que regem a ação o programa dentro do âmbito do SUS.

Ainda há outros órgãos que se destacaram por seus decretos divulgados, a exemplo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que se compromete com legislações mais específicas, como a regulação da utilização de aparelhos de telemedicina para áreas da Medicina, como radiologia.

Em virtude dos argumentos supracitados, uma das certezas estabelecidas por muitos especialistas da área da saúde é de que a telemedicina do Brasil irá crescer bastante ao longo dos próximos anos. O desenvolvimento de novas tecnologias somado à modernização do SUS, servirão de impulsos para o seu destaque.

Uma das maiores vantagens de sua aplicação e evolução em nosso país é a capacidade de oferecer serviço de qualidade para populações que habitam áreas mais remotas e desprovidas de atendimentos básicos de saúde, bem como da realização de exames. Com a telemedicina, o Brasil poderá estar mais unido, da mesma forma que o mundo permanece numa aldeia global, em tempos contemporâneos.

 

Referências:

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  2. Wen, C. L. (2008). Telemedicina e telessaúde–um panorama no Brasil. Informática Pública, 10(2), 7-15.
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  4. Conselho Federal de Medicina. Telemedicina: CFM regulamenta atendimentos online no Brasil. URL: http://www.portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=28061. Arquivo capturado em 27 de março de 2020.
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  9. Machado, F. S. N., Carvalho, M. A. P. D., Mataresi, A., Mendonça, E. T., Cardoso, L. M., Yogi, M. S., ... & Salazar, M. (2010). Utilização da telemedicina como estratégia de promoção de saúde em comunidades ribeirinhas da Amazônia: experiência de trabalho interdisciplinar, integrando as diretrizes do SUS. Ciência & Saúde Coletiva, 15(1), 247-254.
  10. Almino, M. A. F. B., Rodrigues, S. R., Barros, K. S. B., Fonteles, A. S., Alencar, L. B. L., Lima, L. L. D., & Jorge, M. S. B. (2014). Telemedicina: um instrumento de educação e promoção da saúde pediátrica. Revista Brasileira de Educação Médica, 38(3), 397-402.
  11. Unsplash. person wearing lavatory gown with green stethoscope on neck using phone while standing. URL: https://unsplash.com/photos/L8tWZT4CcVQ. Arquivo capturado em 27 de março de 2020.

 


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