Em carta aberta a Associação Nacional dos Médicos Residentes relata a desconsideração da entidade, que tem assento garantido na Comissão Nacional de Residência Médica, frente a nota técnica emitida pelo Ministério da Educação em 14 de Maio de 2020.
A Nota Técnica nº1/2020 da CNRM pode ser lida AQUI ou no site do MEC, AQUI
Tendo em vista a publicação da Nota Técnica nº 1/2020 da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), a Associação Nacional dos Médicos Residentes (ANMR) vem a público expressar sua posição acerca do documento e da situação enfrentada pelos médicos residentes em meio à pandemia de COVID-19.
Em decorrência da reorganização dos serviços visando à resposta ao crescente número de casos de casos da doença, diversos programas de residência em todo o país estão sofrendo alterações, com realocação dos médicos residentes para a linha de frente do atendimento à população. Por conta disso, a carga horária de tais programas e, portanto, seu plano pedagógico, foi comprometida em maior ou menor grau, a depender do serviço em questão.
É consenso entre as entidades médicas brasileiras que a Residência Médica é a modalidade mais adequada para a formação de especialistas devido ao seu caráter de treinamento em serviço sob supervisão, à sua carga horária densa e à presença de atividades teóricas em complementação ao aprendizado prático. Tendo isso em vista, a ANMR entende ser imperativa a garantia da qualidade de formação do especialista, sendo importante a reposição de toda a carga horária perdida em decorrência da crise, tanto por ocasião da realocação de médicos residentes para cenários assistenciais diversos de suas especialidades, quanto por conta da redução do volume de procedimentos eletivos, consultas ambulatoriais e diminuição dos cenários de prática para atender às orientações de distanciamento social e reduzir a exposição dos pacientes ao risco de contágio.
Ao longo das últimas semanas, o texto da Nota Técnica nº 01/2020 vinha sendo elaborado por parte da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), contendo orientações acerca da condução dos programas de residência durante a pandemia e estava sendo aguardado com documento que poderia nortear as decisões a cerca do programas.
É com profundo pesar que a ANMR denuncia que, apesar de ser instituição com representação garantida na plenária da CNRM por força do Decreto n 7.562, não foi oficialmente convocada a participar de todas as reuniões extraordinárias realizadas nas últimas semanas para discutir o documento, além de ter sido impedida de indicar um representante para participar de uma delas.
Mesmo sem ter presença garantida nas reuniões, a instituição teve acesso às minutas do documento, tendo elaborado sugestões de alteração de seu conteúdo. A principal solicitação de alteração foi a inserção de dispositivo que permita que os médicos residentes que tiveram sua carga horária comprometida em demasia por conta da pandemia tenham a oportunidade de trancar ou se afastar dos seus programas, de tal forma que possam se dedicar ao atendimento da população durante a crise, sem prejuízo à sua formação e sem prejuízo ao atendimento dos pacientes, sendo remunerados de forma justa e coerente, para então retomar a residência após o término desse período crítico. O retorno do residente deveria, de acordo com nossa proposta, contar com um cronograma objetivo de reposição da carga horário perdida, garantindo assim a formação adequada de cada especialidade.
Infelizmente, as observações feitas pela ANMR em relação ao documento não foram contempladas e ele foi aprovado em votação da qual a instituição não participou. A garantia de reposição da carga horária perdida, por sua vez, ainda não foi discutida pela CNRM, apesar de repetidas solicitações por parte da ANMR.
A ANMR entende que obrigar os médicos a atuarem na linha de frente contra a COVID-19 mantendo seu status de residente, principalmente nas especialidades que estão sem atividades referentes ao seu respectivo programa, nada mais é do que se aproveitar da classe como mão de obra barata, configurando desvio de função, sem garantias trabalhistas ou de segurança do trabalho e sem preocupação alguma com o aprendizado. Somado a isso, a omissão e falta de debate acerca da necessidade evidente programar a reposição dos conteúdos perdidos caracteriza descompromisso com a formação dos especialistas que atenderão a população em um futuro próximo.
Por mais que seja difícil especificar nesse momento a totalidade da carga horária a serreposta, a ANMR considera fundamental que se delibere acerca da obrigatoriedade de tal reposição, haja vista que o prolongamento dos programas trará impactos diversos, inclusive orçamentários, o que evidencia a necessidade de que se tome uma decisão ainda nos próximos meses de 2020, para que o pagamento das bolsas aos residentes durante o período de reposição possa ser contemplado pela Lei Orçamentária Anual de 2021.
Certa de que toda a comunidade médica compreende a importância de que se lute pela qualidade dos programas de residência, a ANMR reitera que não concorda com a versão final da Nota Técnica nº 01/2020 da CNRM e conclama todas as entidades médicas brasileiras, em especial as sociedades médicas de especialidades, a cobrar pronta definição dor parte da CNRM pela garantia de reposição de toda a carga horária perdida, bem como do direito de trancamento/afastamento dos programas por parte dos residentes que já não possuem benefício educativo algum no desempenho das atividades atualmente em curso.
Lutar pela residência médica de qualidade é inerente à luta pela garantia de saúde e dignidade à nossa população!
São Paulo, 18 de maio de 2020.
Diretoria da Associação Nacional dos Médicos Residentes
Relacionado a essa publicação:
Como o MEC recomenda que seja a atividade dos médicos residentes durante a pandemia?