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A responsabilidade civil do médico e do hospital na cirurgia robótica

A responsabilidade civil do médico e do hospital na cirurgia robótica
Fernanda C. Perin Câmara
mai. 27 - 7 min de leitura
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A cirurgia robótica soa como algo futurístico, mas já está em meio a medicina há mais de 30 anos. A primeira plataforma robô empregada em humanos, denominada Programmable Universal Machine for Assembly, foi utilizada em 1985 para realizar biópsias neurocirúrgicas, bem como sofreu adaptação para ser usada em procedimentos urológicos e de próstata comuns.

Desde então, na década de 90 surgiram diversas versões desses robôs, sendo o mais famoso o ZEUS, lançado em 1998 pela empresa Computer Motion, o robô possuía 3 braços que funcionavam de forma independente e também era equipado com instrumentos cirúrgicos controlados pelo cirurgião, introduzindo o próprio conceito de telepresença, em que o cirurgião (mestre) comanda o servo (robô).

Não obstante, com avanços tecnológicos no tocante a software e demais componentes, surgiu o sucessor do ZEUS: o robô DA VINCI, fabricado pela empresa Intuitive Surgical desde o ano 2000, já foram vendidos mais de 4.500 robôs Da Vinci em todo o mundo. No Brasil, há 41 robôs, sendo que em 2008 haviam menos de 10, estima-se que já ocorreram mais de 17 mil cirurgias robóticas desde então.

No SUS, a cirurgia robótica enfrenta a barreira de custo tecnológico, uma vez que a compra do sistema Da Vinci custa em torno de U$ 2,5 milhões de dólares, ficando o país dependente do surgimento de uma tecnologia mais barata, impondo esse desafio a ser superado pelas industrias que desenvolvem e manufaturam os robôs.

Podemos citar como vantagens da cirurgia robótica minimamente invasiva a alta definição, a visão estereoscópica tridimensional e ampliação, câmera estável e guiada pelo cirurgião, ergonomia aprimorada, amplitude superior de movimento e de escala, porém, não é apenas o robô o responsável por tudo, mas o conjunto da infraestrutura e a constante capacitação de médicos e enfermeiros para que os procedimentos tenham resultados extremamente positivos.

Entretanto, há de ser observadas algumas limitações, a cirurgia robótica não é recomendada para todos os procedimentos médicos e cirúrgicos por não ter sua eficácia comprovada, por exemplo, em 2019, a FDA emitiu alerta na realização da assistência robótica nas mastectomias e outras cirurgias oncológicas por terem mais riscos do que benefícios envolvidos.  

Adentrando aos problemas atrelados ao uso de novas tecnologias e a responsabilidade civil, nos EUA, entre os anos de 2000 a 2013, houve 10.624 relatos de eventos adversos enviados para a FDA, dentre eles: 1,4% foi morte; lesão com 13,1% e mau funcionamento do robô com a porcentagem de 75,9%.

É sabido que com o passar dos anos e os avanços na tecnologia de software e hardware, ocorram cada vez menos eventos adversos, sendo os Recalls uma ferramenta importante para a melhoria constante dos robôs. Nos EUA, o número de recalls caiu, sendo que na última década foram feitos 175 recalls, sendo apenas 8 em 2018.

E como fica a responsabilidade do médico no que tange aos eventos cirúrgicos adversos do esperado que venham a causar dano ao paciente?

 É o médico que detém o poder de controle do robô, valendo-se de instrumentos robóticos como extensão de suas próprias mãos, sendo, portanto, o primeiro sujeito a ter sua atuação analisada, com o objetivo de encontrar a culpa stricto sensu: imperícia, imprudência ou negligência.

Já o hospital, esse responde solidariamente se a culpa do médico for provada (assegurado o direito de regresso), pois responde de forma objetiva, bem como também responde pela falha na prestação de serviço (todo aparato ligado a hospedagem hospitalar bem como zelo e manutenção de todos os equipamentos eletrônicos e robóticos utilizados), ou seja, se o hospital não realizar a manutenção devida em qualquer equipamento e isto causar dano a alguém, comprovadamente, o nosocômio não tem outra alternativa a não ser o de sua responsabilização.

No que diz respeito à responsabilidade do fabricante, o CDC em seus artigos 12 e 13, traz a responsabilização do fabricante de forma objetiva; não depende da análise da culpa: negligência, imprudência ou imperícia. Vejamos:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

        § 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:        I - sua apresentação;        II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;        III - a época em que foi colocado em circulação.

        § 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

        § 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:        I - que não colocou o produto no mercado;        II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;        III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

As tecnologias utilizadas para ajudar nos avanços da medicina são muitas e estão em constante crescimento e aprimoramento, fazendo parte disso os grandes centros, como o hospital Albert Eisten em São Paulo, que, desde 2008, investiu em torno de R$ 46 milhões para tecnologia em cirurgia robótica e conta com um Centro de Excelência em Cirurgia Robótica da América Latina com certificação da norte-americana Surgical Review Corporation (SCR) concedida em 2017.

Apesar de todo avanço, o treinamento médico e da equipe é de extrema importância para a taxa de sucesso de cada procedimento cirúrgico realizado com a assistência do robô, os médicos que possuem vasta experiência nessas cirurgias são chamados de Proctors, eles têm a responsabilidade de acompanhar os primeiros procedimentos robóticos dos cirurgiões especialistas em treinamento na tecnologia, além de assegurar o bom andamento da cirurgia robô-assistida.

Portanto, além do treinamento e técnica do médico e sua equipe, é imprescindível que o hospital forneça todo aparato de manutenção correta do robô, segundo especificações do fabricante, bem como, forneça Termo de consentimento para cada cirurgia robótica realizada, especificando os riscos e suas limitações aos pacientes-usuários.

 

FONTES BIBLIOGRÁFICAS:

Nogaroli, Rafaella. Artigo: “Implicações ético‐jurídicas da medicina robótica e inteligência artificial nas cirurgias e cuidados da saúde”. Disponível: https://academiamedica.com.br/blog/implicacoes-etico-juridicas-da-medicina-robotica-e-inteligencia-artificial-nas-cirurgias-e-cuidados-da-saude#!#_edn4.  Acesso em 26/05/2021;

MORRELL, ANDRE LUIZ GIOIA et al. The history of robotic surgery and its evolution: when illusion becomes reality. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões [online]. 2021, v. 48 [Acessado 26 Maio 2021] , e20202798. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/0100-6991e-20202798>. Epub 13 Jan 2021. ISSN 1809-4546. https://doi.org/10.1590/0100-6991e-20202798.

LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990. Código de defesa do Consumidor. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm

Kfouri Neto, Miguel. Responsabilidade civil dos hospitais: Código Civil e CDC/ 4º ed. rev., atual., e ampl., – São Paulo: Thompson Reuters Brasil, 2019.


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