O que eu vou escrever aqui não é novidade. Talvez seja uma questão até banal para muita gente. Mesmo assim continuo e se você que está lendo já perdeu o interesse, sinto muito.
Vivemos numa sociedade muito feliz! Sim, não acham? Por quê? Temos que estar felizes e bem o tempo todo. A tristeza, a melancolia, é um grande mal. Deve ser tratada com terapia, antidepressivos, exercícios, meditação, alimentação balanceada e tudo mais.
Ficar triste é ruim, concordo, mas todos ficam, uma hora ou outra na vida ficamos para baixo e desiludidos. As pessoas ao nosso redor logo perguntam: “O que houve? Qual o problema?” com uma inflexão de impaciência logo surgindo na voz. Ninguém suporta pessoas tristes por perto. Logo em seguida vem o rótulo: depressão. Existe uma grande diferença, e isso os psiquiatras e psicólogos sabem muito bem(ou sabiam?), entre uma pessoa que fica triste eventualmente e alguém que está permanentemente triste e sem capacidade de fazer nada.
Como disse, vivemos em uma sociedade “feliz”. A tolerância à tristeza diminuiu em nossos dias. Pergunta-se a alguém que acabamos de encontrar: “Tudo bem?” e qual resposta obtemos em 99,9% das vezes? “Sim, tudo bem.” Não é possível! Todas as pessoas estão bem sempre! No fundo sabemos que isto não é verdade.
Por que isso acontece? Porque temos obrigação de dizer que tudo está bem? Uma convenção social que esconde o medo de incomodar os outros. Ninguém gosta de conversar com alguém triste. Mesmo. “A vida já é tão complicada e ainda ter que aguentar alguém “deprê”, nossa, sem chance!” “Sai pra lá, baixo astral!”, ”Deixa disso!” são os pensamentos ou as frases de defesa bem comuns nesses casos.
No entanto, a tristeza deve ter alguma função. Não é sempre um sintoma. Não deve ser percebida como uma monstra devoradora de cérebros ou coisa parecida. Que fique claro, não estou falando de depressão! A tristeza corriqueira que nos afeta de vez em quando e que surge por vários motivos. Saudade, frustração, dor de cabeça, um desentendimento, enfim, seja qual for a razão, esta tristeza não patológica e que muitas vezes é encarada como tal, pode existir e nos ajudar de alguma maneira.
Quando tristes ficamos mais introspectivos. Nos calamos e observamos as coisas que acontecem de outro ângulo. Observamos melhor o nosso interior. Só o fato de ficarmos em silêncio já ajuda muito. A mente nos envolve em uma redoma. Refletimos, paramos e percebemos com grande clareza como somos fracos e falíveis. Vasculhamos os recantos de nossa alma buscando respostas e novos caminhos.
Estar triste não é rabugice. Naturalmente existem pessoas que têm mais momentos de tristeza do que outras. Pessoas mais suscetíveis ou propensas a reagir com tristeza ao mundo que os cerca. Estas em geralmente são encaminhadas aos serviços de psicologia ou psiquiatria e já ganham de presente uma caixinha de medicamento anti-depressivo ou um plano de terapia de um ano.
A tristeza já produziu grandes obras. Livros, músicas, pinturas etc. Quando estamos tristes procuramos um escape, mesmo quietos e sem dizer nada reagimos de alguma forma. Isto também não é fato novo e a História está cheia de exemplos que ilustram bem isso. A mente triste não está morta, está apenas em uma nova área de atividade. Claro que se trata de um momento passageiro, com a alegria também é assim e que eu saiba ninguém tem que tomar remédio por estar feliz.
Nossa “Civilização da Alegria” acaba sufocando muitos sentimentos em nome do bem-estar de todos, não é mesmo? O politicamente correto nos empurra para a resposta mais fácil, nem sempre a verdadeira. Devemos refletir sobre isso. A humanidade finge compreender mas não quer gastar energia entendendo de verdade e acho que isto gera um ciclo falso e vicioso. Um mundo em que o gelo não derrete, o fogo não queima, que as pessoas nunca ficam tristes, um perigoso mundinho irreal.
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