A solidão, um fenômeno cada vez mais prevalente em nossa sociedade global, vem se mostrando não apenas uma questão emocional, mas também um grave risco à saúde. Segundo um relatório do US surgeon general, Vivek Murthy, a solidão crônica pode ser tão prejudicial quanto a obesidade, a inatividade física e o tabagismo, estando associada a uma série de condições de saúde graves, incluindo depressão, demência, doenças cardiovasculares e até mesmo morte precoce. É o que discute um artigo da Nature de 03 de abril de 2024.
Um levantamento conduzido em 2023 pela Meta, Gallup e um grupo de consultores acadêmicos revelou que cerca de um quarto dos adultos no mundo se sentem muito ou bastante solitários. No mesmo ano, a Organização Mundial da Saúde lançou uma campanha para abordar a solidão, classificando-a como uma "ameaça à saúde premente".
Mas, o que torna a solidão tão prejudicial? Estudos recentes começaram a desvendar os mecanismos neurais por trás do impacto devastador da solidão na saúde. A solidão pode alterar diversos aspectos do cérebro, desde o seu volume até as conexões entre os neurônios. Diferente do isolamento social, a solidão é a experiência subjetiva de não estar satisfeito com as relações sociais que se tem.
Os riscos à saúde associados à solidão são vastos e alarmantes. Pessoas solitárias têm maior risco de desenvolver pressão alta, disfunção do sistema imunológico e demência, por exemplo. Uma pesquisa destacou que indivíduos que se sentem solitários têm 1,64 vezes mais chances de desenvolver neurodegeneração do que aqueles que não se sentem solitários.
Além disso, a solidão pode afetar a capacidade de dormir, elevar os níveis de hormônios do estresse e aumentar a suscetibilidade a infecções. No entanto, ainda é desafiador desvendar se a solidão causa esses problemas de saúde ou se pessoas com determinadas condições de saúde são mais propensas a se sentirem solitárias.
Interessantemente, a solidão parece afetar mais gravemente grupos desfavorecidos. Nos Estados Unidos, adultos negros e hispânicos, bem como pessoas com renda inferior a US$50.000 por ano, apresentam taxas de solidão pelo menos 10 pontos percentuais mais altas do que outros grupos demográficos. A pandemia da COVID-19 pode ter exacerbado a solidão, isolando as pessoas por meses ou anos.
Pesquisas indicam que a solidão pode alterar como vemos o mundo, nos tornando mais negativos em relação ao nosso entorno social. Isso pode tornar a solidão uma profecia auto realizável, agravando-se com o tempo. Além disso, estudos mostram que a solidão pode ser contagiosa, espalhando-se por redes sociais.
Os paralelos entre a fome e a solidão são particularmente fascinantes, sugerindo que a solidão evoluiu como um mecanismo motivacional para buscar a companhia dos outros, semelhante à fome e à sede. A solidão também pode tornar os humanos mais sensíveis a recompensas e mais ansiosos para buscá-las, possivelmente devido a alterações no processamento de dopamina, um neurotransmissor ligado à motivação e ao prazer.
Além da dopamina, a solidão também está conectada a altos níveis de hormônios do estresse, como os glicocorticoides, que podem contribuir para o desenvolvimento de demência ao aumentar os níveis de proteínas que formam placas no cérebro.
Diante desses desafios, algumas soluções emergem, como o aumento do acesso a atividades sociais e o incentivo ao exercício físico, que não apenas melhora o humor, mas também promove a socialização. Este crescente corpo de pesquisa destaca a urgência de abordar a solidão como um problema de saúde pública, incentivando a criação de estratégias que promovam o bem-estar social e emocional em todas as idades.
Referência:
Sidik, S. M. (2024, April 3). Why loneliness is bad for your health. Nature. https://www.nature.com/articles/d41586-024-00900-4