Antes que você comece a leitura deste texto ávido por alguma discussão ideológica, quero avisar que as informações que você vai ler a seguir foram escritas com base em pesquisas realizadas com norte-americanos. Qualquer semelhança com a realidade brasileira é (ou não) mera coincidência.
Costumo dizer que escolhi o jornalismo como profissão por causa da política e deixei o jornalismo como profissão, também por causa da política. Hoje, como comunicadora com 12 anos de formação (e acadêmica de medicina), acompanho o cenário político nacional e internacional sem me isentar de opiniões, mas tenho adotado a prática de me distanciar de discussões acaloradas que mais parecem monólogos nos quais todos os lados são donos de verdades absolutas. Prefiro os diálogos construtivos que enriquecem o debate (um abraço para os grupos de família no whatsapp e para os fãs de #deixandodeseguir nas redes sociais que sequer procuram ouvir a opinião divergente para confrontá-la!).
Mas vamos deixar os preâmbulos e as questões ideológicas de lado e vamos ao que interessa. Quero compartilhar com você, leitor, o resultado de uma pesquisa da University of Nebraska-Lincoln, realizada pela primeira vez em 2017 e refeita em 2020, que demonstrou que quase 40% dos norte-americanos entrevistados estavam estressados por causa da exposição à política.
Além disso, este estudo destacou que entre um quinto e um terço dos adultos (50 milhões a 85 milhões de pessoas) culparam a política por causar fadiga, sentimentos de raiva, perda de paciência e desencadear comportamentos compulsivos. Números expressivos, não é?
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Um dos pontos mais impressionante sobre o estudo foi a constatação repetida, em 2017 e 2020, de que 5% dos americanos culpam a política por ter pensamentos suicidas. Isso pode ser considerado um sério problema de saúde pública!
Outras descobertas (2017):
- 11,5% relataram que a política afetou negativamente sua saúde física;
- 31,8% disseram que a exposição a meios de comunicação que promovem pontos de vista contrários às crenças pessoais os enlouqueceu;
- 29,3% disseram que perderam a calma por causa da política;
- 1 em cada 5 diz que diferenças de opiniões políticas prejudicaram uma amizade;
- 22,1% admitem que se preocupam demais com quem ganha e quem perde a eleição.
Esses resultados foram observados na primeira pesquisa e se mantiveram estável após 4 anos. Apenas três dos 32 itens da pesquisa mostraram diferenças médias significativas entre 2017 e 2020: política causando fadiga, pensando em política mais do que gostaria e política criando problemas na família extensa.
É interessante observar também que os adultos com maior probabilidade de serem afetados negativamente pela política eram jovens, mais frequentemente democratas (EUA), mais interessados em política e mais engajados politicamente.
Ok, mas como a política pode prejudicar a saúde?
O mecanismo pelo qual a política pode prejudicar a saúde é relativamente bem compreendido cientificamente: ela é um estressor crônico. A política satura a cultura popular e permeia o cotidiano por meio das mídias sociais, televisão e notícias diárias.
Segundo o cientista político que liderou a pesquisa, Kevin Smith, os efeitos negativos da política no bem-estar social são vários e já estão documentados em estudos: assédio on-line por expressar opiniões políticas; comportamentos relacionados ao estresse, como o aumento do consumo de álcool, observados em apoiadores de candidatos perdedores; diagnostico com condição de saúde psicológica, como ansiedade ou depressão, relacionado à maior exposição a anúncios de campanha. Tudo isso sem citar os efeitos fisiológicos!
E a saúde, pode prejudicar a política?
Como você pode observar, colega leitor, a política pode realmente estar afetando de forma prejudicial a vida de muitas pessoas, ou pelo menos elas estão tendo essa percepção negativa em suas vidas (e dessa vez não é apenas pela falta de recursos públicos investidos na a saúde, corrupção ou outras politicagens).
Entretanto, não estou querendo argumentar aqui que o fato de a politica ter impactos negativos na saúde seja um motivo para se discutir menos sobre política. Pelo contrário!
Além de uma questão de saúde e bem-estar, uma preocupação importante que precisamos ter ao ler os dados apresentados acima é o fato de que as pessoas podem, em algum momento, ver a política como conflituosa e uma potencial ameaça ao seu próprio bem-estar. Isso pode levar a pensamentos simplórios como: 'que se dane, não quero me envolver', que não devem acontecer. As democracias dependem da participação de cidadãos engajados civilmente, e não se envolver, pode ser tão prejudicial quanto estar engajado.
Por isso, a resposta que precisamos encontrar aqui é como debater sobre política de forma engajada e saudável? Como compreender a opinião e os motivos do outro, independente de qual seja a minha visão (e não prejudicar o meu bem-estar por causa disso)?
Referências
- Faber, B. A.; “Clowns to the left of me, jokers to the right”: Politics and psychotherapy. Journal of Clinical Pysichology 15-mar-2018. https://doi.org/10.1002/jclp.22600
- Gayman, D. Stressed out: Americans making themselves sick over politics. Nebraska Today. 25-set-2019. Disponível em https://news.unl.edu/newsrooms/today/article/stressed-out-americans-making-themselves-sick-over-politics/
- Gayman, D. Still stressed: Americans’ political diet harmful to overall health. Nebraska Today. 14-jan-2022. Disponível em https://news.unl.edu/newsrooms/today/article/still-stressed-americans-political-diet-harmful-to-overall-health/
- Smith, K. B.; Hibbing, M. V.; Hibbing, J. R.Friends, relatives, sanity, and health: The costs of politics. PLOS ONE. 25-set-2019. doi.org/10.1371/journal.pone.0221870
- Smith, K. B. Politics is making us sick: The negative impact of political engagement on public health during the Trump administration. PLOS ONE. 14-jan-2022. doi.org/10.1371/journal.pone.0262022