Através do estudo publicado na revista Nature em 26 de julho de 2023, intitulado Evolutionary histories of breast cancer and related clones, mergulhamos em uma investigação sobre a origem e a evolução do câncer de mama, uma doença que afeta milhões de mulheres em todo o mundo. As revelações sobre a expansão clonal e o surgimento de múltiplos "fundadores" de câncer fornecem um panorama mais complexo do desenvolvimento do câncer de mama, superando conceitos previamente estabelecidos. Como especialistas na área médica, estes insights nos permitem aprimorar a prevenção, detecção precoce e tratamento desta doença. Em particular, a identificação da alteração cromossômica específica der(1;16), prevalente no subtipo de câncer de mama Luminal A, ilumina novos caminhos para a estratificação de pacientes e o desenvolvimento de tratamentos personalizados.
O estudo em questão, apresenta uma visão inovadora sobre a compreensão da origem e evolução do câncer de mama, alcançada por meio do emprego de tecnologias avançadas de sequenciamento genômico. Esta abordagem permitiu aos pesquisadores rastrear a evolução do câncer de mama e suas lesões precursoras, desde a aquisição das primeiras mutações causadoras até o surgimento da doença clinicamente diagnosticada.
A pesquisa indica que um fenômeno denominado "expansão clonal" é comum em tecidos normais ou não cancerígenos. Na biologia, a expansão clonal se refere ao processo no qual uma célula com uma determinada mutação começa a se dividir de forma mais eficaz do que as células vizinhas, resultando em uma população de células que todas partilham essa mesma mutação genética. Isso é comumente observado no câncer, onde mutações que conferem uma vantagem de crescimento ou sobrevivência levam a uma expansão desse clone mutante.
Este estudo sugere que mutações frequentemente observadas no câncer também podem impulsionar a expansão clonal em tecidos não cancerígenos. Isso implica que essas mutações selecionadas em populações celulares não cancerígenas podem potencialmente pavimentar o caminho para o subsequente desenvolvimento de câncer.
O estudo concentrou-se no câncer de mama, uma das doenças mais prevalentes entre as mulheres, afetando 2,3 milhões de mulheres em todo o mundo anualmente. Os pesquisadores realizaram sequenciamento de genoma inteiro (Whole Genome Sequencing - WGS) de várias amostras em microescala obtidas de câncer e de lesões benignas da mama relacionadas clonalmente (Benign Breast Lesions - BBLs), juntamente com lóbulos aparentemente normais.
Através de análises filogenéticas, foi possível rastrear a evolução do câncer de mama e das lesões precursoras. A cronologia absoluta e a ordem dos primeiros eventos direcionadores foram mais precisamente estimadas, permitindo uma compreensão mais aprofundada da evolução do câncer de mama. As descobertas sugerem que a aparência do ancestral comum mais recente (Most Recent Common Ancestor - MRCA) de clones de câncer e não câncer geralmente não ocorreu antes dos 20 a 30 anos do paciente. Portanto, parece levar mais de 10 anos desde a aquisição das primeiras alterações direcionadoras antes que os fundadores iniciais do câncer apareçam.
Adicionalmente, a pesquisa revelou que as células de câncer, chamadas aqui de "clones de câncer", muitas vezes se originam em várias partes do corpo (um processo conhecido como evolução multifocal) a partir de células ancestrais que compartilham mutações similares, mas que ainda não se transformaram em câncer. Isso significa que vários "fundadores" de câncer podem surgir a partir de um grupo de células que não são cancerígenas. Este processo de surgimento de vários focos de câncer a partir de uma mesma população de células pode ser mais comum na progressão do câncer do que se pensava anteriormente.
O estudo também destacou um perfil mutacional único no epitélio mamário, que é distinto de outros tecidos. O perfil mutacional reflete as mudanças dinâmicas que o epitélio mamário passa ao longo da vida de uma mulher, em sintonia com os ciclos menstruais e eventos de gravidez e lactação.
Em resumo, o estudo realça a importância única de uma alteração cromossômica específica, conhecida como der(1;16), que é uma anormalidade que envolve a fusão dos cromossomos 1 e 16. Essa alteração é especialmente relevante na principal subcategoria do câncer de mama chamada Luminal A, que é um tipo de câncer de mama que tende a crescer lentamente e tem um melhor prognóstico comparado a outros tipos. As descobertas deste estudo podem ajudar a aprofundar nossa compreensão sobre como o câncer de mama se desenvolve e pode contribuir para a criação de novas estratégias para prever, diagnosticar precocemente e até prevenir o câncer de mama.
Para leitura do estudo na íntegra, disponibilizamos aqui o link de acesso.
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Referência:
Nishimura, T., Kakiuchi, N., Yoshida, K. et al. Evolutionary histories of breast cancer and related clones. Nature (2023). https://doi.org/10.1038/s41586-023-06333-9