A Constituição Federal de 1988, através de uma análise detida acerca da saúde por seus Parlamentares Constituintes, consagrou o direito à saúde como um direito fundamental precípuo a manutenção da vida. Assim, legitimou a busca da concretização desse direito, a garantia do acesso a bens e serviços de saúde, por meio do Poder Judiciário.
Dessa forma, pode o sistema de justiça exigir que o direito da saúde, cujo dever de execução é do sistema de saúde, seja efetivado. Esse fenômeno é denominado de judicialização da saúde.
Essa procura do Poder Judiciário para efetivação do direito à saúde não é atual. Pelo contrário, ocorre no Brasil a décadas, porém ascendeu de modo não administrável na última década, tendo por seu turno um impacto profundo na vida, na sociedade e principalmente no orçamento público.
Conforme apontado acima, evidencia-se uma tendência de crescimento dos processos relacionados à saúde pública, de forma mais preponderante entre 2013 e 2014.
A maior motivação da judicialização da saúde ainda está relacionada com o fornecimento de medicamentos e de tratamento médico-hospitalar, conforme aponta o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
No tocante aos reflexos da judicialização da saúde perante o Ministério da Saúde, observou-se que o número de ações judiciais ocorre em municípios com maior índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM), o que indica uma ausência de relação causal entre judicialização da saúde e subdesenvolvimento em saúde.
O reflexo orçamentário perante Ministério da Saúde no cumprimento das decisões judiciais na área da saúde aumentaram mais de quatorze vezes nos últimos oito anos, conforme aponta o estudo do Tribunal de Contas da União.
No âmbito dessas ações judiciais, há indícios da atuação da indústria farmacêutica juntamente com associações de pacientes, o que, apesar de ser visto com suspeita e como um conflito de interesses, não exclui a necessidade desses medicamentos pelos pacientes.
Associado aos interesses legais, é necessário a detecção de possíveis fraudes, sejam elas oriundas de prescrições médicas desnecessárias, tratamentos não reconhecidos nacionalmente e alheios a medicina baseada em evidências.
Reflexo de suma importância e preocupação é o impacto financeiro das demandas judiciais nos orçamentos públicos.
Cabe ao Conselho Federal de Medicina (CFM) fiscalizar a emissão de prescrições médicas de medicamentos, procedimentos e outros itens de saúde que não tenham sido registrados pela Anvisa, bem como divulgar e alertar aos profissionais médicos que a prescrição de medicamento sem registro na Anvisa afronta a Lei 6.360/1976 e o Código de Ética Médica.
Ademais, quando do estudo da judicialização da saúde, verifica-se de regra a busca de medicamentos que não são incorporados pelo SUS em suas listagens, ocorre que também existem ações judiciais que requerem o fornecimento de itens e procedimentos que estão incorporados ao SUS, e deveriam ser fornecidos regularmente, sem a necessidade de intervenção judicial.
Em relação a medidas que podem subsidiar o poder judiciário na solução das demandas judiciais, como se observou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) expediu importantes recomendações nesse sentido, como por exemplo:
a) celebração de convênios para oferecer apoio técnico aos magistrados;
b) especialização de varas para processar e julgar ações cujo objeto seja o direito à saúde; e
c) inclusão da legislação relativa a direito sanitário no programa dos concursos para ingresso na carreira da magistratura e nos programas dos cursos de formação, vitaliciamento e aperfeiçoamento de magistrados.
Destarte, embora a judicialização seja um modo legítimo de se buscar a efetiva concretização do direito à saúde, esse fenômeno gera efeitos negativos à administração pública, tais como um impacto orçamentário e financeiro, que afeta a capacidade de os gestores executarem as políticas de saúde planejadas; a possibilidade da utilização de medicamentos, produtos e insumos que não tiveram a sua qualidade, segurança e eficácia atestadas pela Anvisa; além da possibilidade da existência de fraudes, que oneram ainda mais os cofres públicos.
Por mais que a judicialização da saúde diga respeito ao legítimo exercício de direitos fundamentais (direito de ação e direito à saúde), trata-se de um indicador de funcionamento anômalo do sistema sanitário com a contribuição do sistema de justiça.
Conheça mais sobre o assunto na obra Judicialização da Saúde: Ineficácia dos Princípios Constitucionais da Igualdade e Universalidade à Saúde, de André Viana!