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03 de setembro - o Dia do Biólogo na visão de uma estudante de Medicina

03 de setembro - o Dia do Biólogo na visão de uma estudante de Medicina
Caroline Ahrens Ortolan
set. 3 - 6 min de leitura
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Desde pequena sempre amei estar entre a natureza. Ter contato com os animais, andar sem sapatos, comer frutas direto do pé, ouvir o murmulho das folhas das árvores ao vento, o canto das aves, o cheiro do riacho correndo no meio das pedras. Criada em um apartamento no meio de Curitiba, sempre percebi o quanto me sentia completa ao entrar em um bosque ou dar uma caminhada no parque. Hoje em dia sei que isso tem até nome: "Forest Bathing", ou Banho de floresta, em português, termo derivado de "shinrin-yoku", nome japonês a este tipo de ecoterapia.

Durante o ensino médio, me decidi por prestar o vestibular de Biologia. Em 2010, estava eu ingressando no curso que eu tanto queria fazer, na Universidade Federal do Paraná. Acredito que grande parte das crianças já tiveram o sonho de trabalhar com golfinhos, e comigo não foi diferente. A chamada "megafauna carismática" é algo que realmente chama a atenção, nos cativa e tem apelo emocional. Ou você já viu alguma ONG pedindo doações para combater a ameaça à extinção de coccinelídeos nativos causada pela introdução de joaninhas asiáticas?

No começo do curso, já sofri aquele balde de água fria: primeiro ano e já tive contato com Cálculo Diferencial e Integral, Química, Física, Biofísica, Bioquímica, Metodologia Científica, Microbiologia, Biologia Celular, Anatomia Comparada. E eu achando que ia aprender sobre golfinhos. Não que eu não os tenha estudado, pois eventualmente me deparei com eles na disciplina de Metazoa 4, no terceiro ano, e fiz diversos cursos de campo sobre cetáceos. Continuo amando a megafauna, mas também aprendi a amar todos os outros objetos de estudo das Ciências Biológicas. Ao longo do curso, pude estudar com profundidade toda a variabilidade genética, morfofisiológica e ecológica do fitoplâncton, sequenciar o genoma de bactérias de uma amostra de solo, estudar doenças humanas e animais, aprender sobre o funcionamento do nosso sistema imune, trabalhar com estudos ecológicos, entrar em cavernas e capturar morcegos, e estudar fósseis de bilhões de anos. Também pude me aprofundar em diversos temas ligados à educação, já que, além do bacharelado, também segui a licenciatura.

Terminada a graduação e ainda incerta do meu futuro profissional, decidi cursar uma pós-graduação em Gestão Ambiental, pois senti que alguns temas ligados ao mercado e a áreas paralelas como as engenharias, agronomia, veterinária e administração me eram falhos. Embora eu tenha aprendido muito e tenha me conectado com muitas pessoas especiais, ainda não estava satisfeita, e já estava desanimada sobre a possibilidade de ter um real propósito e fazer a diferença positiva no planeta.

Com 25 anos me vi iniciando a minha segunda graduação, então em Medicina. Eu já sabia que o caminho não seria fácil, mas o que me esperava estava muito além de tudo o que eu havia imaginado. Já nas primeiras semanas, pude observar, com tristeza, a quase constante competição por desempenho que existe entre os alunos e que os acompanhará até muito depois da formatura. O brilho nos olhos dos alunos, animados por terem conquistado a tão sonhada vaga em Medicina na UFPR após árduos anos de cursinho, era apagado no primeiro comentário humilhante de algum professor. No terceiro ano fui pega de surpresa por uma pandemia que paralisou o curso por 6 meses e fez com que toda a estrutura de um curso basicamente prático tivesse que ser revista e adaptada, e até agora estamos sentindo os efeitos deste atraso. No segundo ano presenciei o primeiro óbito de um paciente, e também precisei dar um passo atrás e perceber que eu também estava ficando doente.

Ao dar este passo para trás, precisei ressignificar muitas coisas na minha vida e trajetória. Lembrei daquela menina que adorava andar descalça na terra recém molhada pela chuva, estudar sobre os animais mais venenosos do planeta e sobre a maneira como as ações humanas predatórias estão destruindo a nossa casa e, mais importante, o que podemos fazer para contornar a situação. Descobri que, como bióloga, posso contribuir muito na medicina, uma vez que, sob uma perspectiva mais ampla, nós dividimos a Terra com milhões de outras espécies e que, assim como Fritjof Capra nos ensina em seus livros, os seres humanos estão profundamente ligados à teia da vida em nosso planeta. Isso demonstra a necessidade de reorganizarmos o mundo segundo um conjunto de crenças e valores que não tenha o acúmulo de riquezas por único sustentáculo, e isso não só para o bem-estar das organizações humanas, mas para a sobrevivência e sustentabilidade do planeta como um todo.

Hoje vejo que biólogos e médicos têm muitas características em comum: curiosidade, vontade de investigar, um pouco de teimosia, é verdade, mas o mais importante: o desejo de melhorar a vida das pessoas e de tornar o mundo um lugar mais acolhedor e com um futuro mais próspero. Todos nós temos paixão pela vida. Ficam aqui os meus parabéns aos colegas de profissão, com uma citação de Lynn Margulis, bióloga que tanto contribuiu para a Biologia, Medicina e ciência.

A pergunta "O que é vida?" é uma armadilha linguística. Para respondê-la de acordo com as regras gramaticais, devemos fornecer um substantivo, uma coisa. Mas a vida na Terra assemelha-se mais a um verbo. Ela conserta, sustenta, recria e supera a si mesma.”

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