De acordo com dados do portal de Transparência do Registro
Civil, mantido pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais,
o acidente vascular cerebral (AVC) matou 87.518 brasileiros, de 1º de janeiro
até 13 de outubro deste ano. O número equivale à média de 12 óbitos por hora,
ou 307 por dia, e faz do AVC a principal causa de morte no país. No mesmo
período, o infarto vitimou 81.987 pessoas e a Covid-19 59.165 cidadãos.
A presidente da Rede Brasil AVC e também da Organização
Mundial de AVC, neurologista Sheila Cristina Ouriques Martins, diz que, por
mais de 30 anos, o acidente vascular cerebral foi a primeira causa de morte no
país. Isso mudou a partir de 2011, quando tomou mais impulso a organização do
cuidado agudo do AVC. “O paciente, tendo AVC, tem aonde ir. Ele chega a
hospitais preparados. Esse número de hospitais aumentou muito.”
A neurologista ressaltou, porém, que com o começo da
pandemia de Covid-19, os pacientes praticamente desapareceram, ficando mais em
casa. Segundo a médica, a partir do final de 2020, o número de casos de AVC
aumentou muito. Os pacientes começaram a chegar em estado mais grave, mais
jovens e em maior número. “O AVC passou a ser, de novo, a primeira causa de
morte no país”.
De acordo com Sheila, isso aconteceu provavelmente porque as
pessoas ficaram mais tempo sem prevenção, mais tempo sem ir ao médico e
deixaram de tomar medicamentos preventivos, o que pode ter contribuído para o
aumento de casos mais graves pós-pandemia.
Como as pessoas já voltaram a procurar atendimento médico, a
Rede Brasil AVC está com nova campanha de orientação para que as pessoas
aprendam a reconhecer os fatores de risco e a se prevenir. “E também para que
saibam que o AVC tem tratamento e que, se acontecer, o paciente tem que ir
rápido a um hospital preparado para dar o atendimento adequado, porque isso
salva vidas e diminui as sequelas do paciente.”
Segundo Sheila, a sigla Samu, criada pela Liga de Estudantes
de Neurologia da Bahia, é eficaz para verificar se uma pessoa está sofrendo um
AVC. “Pede-se que o paciente dê um sorriso (S) e observa-se se a boca fica
torta; pede-se para elevar os braços e dar um abraço (A) e observa-se se um
braço cai porque está mais fraco; pede-se para cantar uma música ou dizer uma
mensagem (M) para ver se a fala está enrolada. Uma vez identificados esses
sinais, deve-se ligar urgente (U) para o 192, porque a cada 1 minuto são quase
2 milhões de neurônios que morrem se o AVC não for tratado”.
Existem dois tipos de AVC: o isquêmico, que ocorre quando
falta sangue em alguma área do cérebro e corresponde a 80% ou 85% dos casos; e
o hemorrágico, quando um vaso arterial se rompe. O socorro rápido evita o
comprometimento mais grave, que pode deixar sequelas permanentes, entre as
quais redução de movimentos, perda de memória e prejuízo à fala, “além de
diminuir de forma drástica o risco de morte”, afirmou a presidente da Rede
Brasil AVC.
Espasticidade
Pouco conhecida pelo nome técnico, a espasticidade, que se
caracteriza pela rigidez muscular dos membros inferiores ou superiores, afeta
cerca de 40% dos pacientes pós-AVC. Essa condição deve ser tratada para
devolver qualidade de vida aos pacientes, disse o presidente da Associação
Brasileira de Fisiatria e Reabilitação Física, Eduardo Melo.
A associação está promovendo a campanha “Tempo É Movimento”,
com o objetivo de conscientizar a população de que as sequelas do AVC podem e
devem ser tratadas. Segundo Eduardo Melo, a rigidez e os espasmos musculares, que
são chamados de espasticidade, podem acontecer pós-AVC e devem ser tratados
para devolver a mobilidade às pessoas e trazer mais qualidade de vida e
independência. “Infelizmente, ainda é muito comum acharmos que é normal o
paciente conviver com a sequela pós-AVC. E não deve ser assim", afirmou.
O diagnóstico da espasticidade é clínico e depende do grau
do tônus muscular e da dificuldade do paciente em alongar o músculo afetado. Em
geral, a espasticidade começa a aparecer nos primeiros três meses após a ocorrência
do AVC. O tratamento deve ser multidisciplinar, com o acompanhamento por
diversos especialistas (fisiatra, neurologista e fisioterapeuta, entre outros),
e pode contar com medicamentos orais e injetáveis.
A cardiologista e especialista em medicina esportiva Renata
Castro lembra que, como o cérebro é responsável pelo comando de diferentes
funções do corpo, as sequelas vão depender de qual área foi acometida pelo AVC.
“Quanto antes o atendimento ao paciente com AVC for realizado, maior a chance
de sobrevivência sem sequelas. Por isso, é importante que toda a população seja
capaz de reconhecer os sinais do AVC, lembrados pela sigla Samu: sorriso,
abraço, mensagem, urgência”, completou a cardiologista.
Demência vascular
Pequenos infartos múltiplos no cérebro, causados pela
interrupção do fluxo sanguíneo, podem causar demência vascular. De acordo com o
neurologista Marcus Tulius, do Complexo Hospitalar de Niterói e pesquisador da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a doença representa cerca de 5% entre todos os
tipos de demência e é uma sequela importante do AVC.
o problema costuma aparecer em até três meses após o AVC
isquêmico e tem evolução rápida e maior que o de outros tipos de demência. “A
demência vascular é a segunda causa mais comum que envolve lesões neurológicas
em idosos e representa cerca de 5% entre todos os tipos de demência, ficando
atrás somente da doença de Alzheimer.”
A condição é caracterizada por pequenas interrupções do
fluxo sanguíneo, chamadas de infarto, que ocorrem no cérebro ao longo da vida,
principalmente em pessoas que já tiveram AVC. Esses infartos são localizados
estrategicamente no sistema nervoso central e dão origem a diversos prejuízos
cognitivos. Marcus Tulius ressaltou que esse tipo de demência é irreversível.
Apesar disso, a doença pode ser tratada para atrasar a progressão e dar mais
qualidade de vida aos pacientes.
O diagnóstico da demência vascular é feito por meio de
exames neurológicos e de imagem, como ressonância magnética e tomografia
computadorizada, além de avaliação médica dos sintomas apresentados pelo
paciente e seus hábitos de vida.
Sintomas
O acidente vascular cerebral acontece quando se obstruem ou
se rompem vasos que levam sangue ao cérebro, provocando paralisia da área
cerebral que ficou sem circulação sanguínea. A doença acomete mais homens e
idosos acima de 65 anos de idade, mas mulheres, quando entram na menopausa, têm
risco equivalente ao dos homens, destacou a neurologista Sheila Martins. Os
negros têm correm maior risco, devido à pressão alta não controlada. “Mas a
maioria dos fatores pode ser identificada precocemente e tratada, porque 90%
dos casos de AVC podem ser evitados.”
Entre os sintomas, estão fraqueza ou formigamento na face,
braço e perna, confusão mental, alteração na visão, no equilíbrio, na
coordenação e dor de cabeça súbita e intensa. Os fatores que podem levar ao AVC
são pressão alta, colesterol elevado, fumo, abuso de álcool, sedentarismo,
obesidade, diabetes, arritmia cardíaca, depressão, ansiedade e alimentação inadequada.
Jovens e crianças também têm risco de sofrer AVC, mas é um
risco menor”, disse Sheila Martins. Segundo a médica, o número vem aumentando
porque as pessoas são mais obesas, mais sedentárias, não se alimentam bem e têm
hipertensão mais precocemente. Isso tem feito com que as pessoas tenham AVC
mais jovens.
A Rede Brasil AVC é uma organização não governamental criada
em 2008 com a finalidade de melhorar a assistência multidisciplinar a pacientes
com acidente vascular cerebral em todo o país.
Fonte: Agência Brasil.
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