Recentemente publicamos na Academia Médica textos sobre achados demenciais em exames complementares e sobre a maior propensão de desenvolver Alzheimer em mulheres.
Demência: sinais de comprometimento cerebral podem ser identificados anos antes do diagnóstico
Estudo descobre por que mulheres são mais propensas a desenvolver Alzheimer
As doenças demenciais possuem prevalência dobrada a cada 5 anos a partir dos 65 anos de idade. Além disso, segundo o Ministério da Saúde, cerca de 1,2 milhão de brasileiros têm a doença, sendo que 100 mil novos casos são diagnosticados a cada ano.
Mas afinal, quais são as doenças demenciais?
As doenças demenciais são divididas em 3 grandes grupos:
Neurodegenerativo: tem como representantes Alzheimer, Corpúsculos de Lewy, Frontotemporal, Demência da doença de Parkinson.
Cerebrovascular: pode resultar de infarto único estratégico, Múltiplos infartos ou isquemia subcortical por doença de pequenos vasos
Causas potencialmente reversíveis: demência acometida por: Hidrocefalia de pressão normal, Alterações eletrolíticas, Disfunção tireoidiana, Deficiência de vitaminas, Infecções, Relacionada com fármacos
Outras causas: Doença priônica (Creutzfeldt-Jakob), induzida por radioterapia
Dentre essas causas e doenças, a mais prevalente é a doença de Alzheimer, sendo encontrada em 55,1% dos pacientes, em um estudo populacional brasileiro, o qual também identificou que 14,4% apresentavam doença de Alzheimer associada a doença cerebrovascular (demência mista) e 9,3% apresentavam demência vascular. Além disso, apenas 1 caso (0,8%) de demência potencialmente reversível foi encontrado, causado por deficiência de vitamina B12.
Por ter uma evolução insidiosa e progressiva, a doença de Alzheimer é dividida em 3 fases: leve, moderada e grave. Na fase leve, o paciente pode apresentar alterações do comportamento, como apatia, irritabilidade e depressão. Os sintomas são gerados por um comprometimento da memória episódica, assim, o paciente tem dificuldade para memorizar uma pequena lista de compras, compromissos, detalhes de conversas e acontecimentos. Além disso, a realização das atividades instrumentais complexas estão comprometidas, como administração de finanças, ingestão de medicamentos, compras e deslocamentos para fora da vizinhança.
Na fase moderada, a apatia se agrava e alguns pacientes passam a ter distúrbios de sono, sintomas psicóticos e agitação psicomotora. Também, o paciente apresenta dificuldade para armazenar novas informações, torna-se lento, tem dificuldade de encontrar palavras, orientar-se no espaço, resolver problemas e planejar.
Na fase mais avançada da doença, o paciente tem um comprometimento grave de todas as funções cognitivas e a capacidade de se comunicar é restrita a cumprimentos e conversas triviais. O paciente passa a ser dependente para a realização de atividades diárias, e pode apresentar incontinência urinária e fecal.
Avaliação e diagnóstico
Na avaliação inicial do Alzheimer, é necessária a investigação de sintomas psiquiátricos, uma vez que em sua maioria, as queixas cognitivas são predominantemente sintomas depressivos e ansiosos. As queixas vagas, em que predominam dificuldades de memória episódica (esquecer acontecimentos ou conversas), estão associadas a um maior risco de desenvolvimento de Alzheimer.
O diagnóstico de Alzheimer é essencialmente clínico e para auxiliar no diagnóstico pode-se usar alguns testes cognitivos, como o Miniexame do estado mental, a avaliação cognitiva Montreal, a Lista de palavras “consortium to establish a registry for Alzheimer’s disease” e os questionários Pfeffer (Questionário de atividades funcionais) e IQCODE (Questionário do informante sobre o declínio cognitivo do idoso). Além disso, é preciso utilizar critérios clínicos para o diagnóstico, como o elaborado pelo Instituto Nacional do Envelhecimento e pela Associação de Alzheimer (NIA-AA) e/ou o DSM-5.
Apesar do diagnóstico ser clínico, exames complementares são solicitados para descartar as demais etiologias demenciais. Recomenda-se solicitar neuroimagem por tomografia ou ressonância magnética de crânio e exames laboratoriais, incluindo vitamina B12 e TSH.
Tratamento
O tratamento da doença demencial tem como foco a não progressão da doença. Para isso, uma das classes medicamentosas utilizadas é a dos anticolinesterásicos, representada por donepezil, rivastigmina e galantamina. Estes medicamentos podem ser utilizados em todas as fases da progressão demencial e melhoram a transmissão colinérgica por meio da inibição da enzima responsável pela degradação da acetilcolina na fenda sináptica.
Os principais efeitos colaterais observados relacionam-se ao trato gastrointestinal: náusea, vômito, anorexia e diarreia. Perda ponderal de até 4 kg é comum no início do tratamento, mas o peso tende a estabilizar após alguns meses. Uma minoria de paciente pode apresentar cãibras e distúrbios do sono. Devem ser utilizados com cautela em indivíduos com bradicardia e distúrbios de condução elétrica cardíaca.
Recomendação: Para todos os anticolinesterásicos, deve-se aumentar a dose a cada 4-6 semanas, sendo que o alvo é atingir a dose máxima.
O aducanumab foi aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para o tratamento de doença de alzheimer leve. Entretanto, não há certeza do benefício clínico do tratamento e o medicamento possui riscos conhecidos que requerem monitoramento rigoroso com avaliações clínicas e de imagem.
Além desses medicamentos, o uso da memantina também é indicado. Esse fármaco é um antagonista de baixa afinidade para os receptores N-metil-D-aspartato (NMDA).Recomenda-se o seu uso em fases moderada e grave da doença, ajustando-se a dose gradualmente até atingir a máxima.
Em relação aos sintomas comportamentais, a abordagem inicial deve ser baseada em estratégias não farmacológicas, consistindo em contato social, engajamento em atividades produtivas, exercícios físicos e recreação. Em casos de recorrência, especialmente na presença de sintomas psicóticos e agressividade, os antipsicóticos podem ser utilizados, mas apresentam eficácia limitada e determinam maior risco de eventos cardiovasculares. Os agentes atípicos têm sido mais utilizados por apresentarem menor efeito extrapiramidal. e as drogas com maior evidência de benefício são risperidona, olanzapina e aripiprazol.
Leia mais:
Dia Mundial de Conscientização do Alzheimer. 1,2 milhão de pessoas convivem com a doença no Brasil
Idosos têm mais riscos de desenvolver Alzheimer após infecção por Covid-19
Molécula produzida pela microbiota intestinal é relacionada à Doença de Alzheimer
REFERÊNCIAS
1- MARTINS, Mílton de Arruda; SAAD, Rafael; MORINAGA, Christian Valle; IVANOVIC, Lígia Fidelis; JORGE, Maria Cecília Pavanel; OLIVEIRA, Júlio César de; BRICOLA, Solange Aparecida Petilo de Carvalho. MANUAL DO RESIDENTE de Clínica Médica. São Paulo: Manole, 2017
2- UptoDate - Treatment of Alzheimer disease
3- UpToDate - Clinical features and diagnosis of Alzheimer disease