A amamentação oferece imensos benefícios para bebês e crianças pequenas, ajudando-as a sobreviver e desenvolver todo o seu potencial, fornecendo energia e nutrientes, reduzindo os riscos de infecção e diminuindo as taxas de obesidade e doenças crônicas na vida adulta. Sabe-se também que a prática é benéfica à saúde materna, diminuindo a ocorrência de doenças cardiovasculares e sendo importante fator protetor contra o câncer de mama.
No entanto, apesar de todos os benefícios, ao redor do mundo apenas um
em cada dois recém-nascidos é amamentado na primeira hora de vida. Além disso,
menos da metade dos bebês com idade inferior a seis
meses são amamentados exclusivamente, como recomenda a Organização
Mundial da Saúde (OMS).
Dadas as contribuições significativas da amamentação para a saúde, a revista científica The Lancet publicou, em 7 de fevereiro, uma série de três artigos sobre amamentação em 2023. Esta sustenta que empresas de substitutos do leite materno e fórmulas exploram as emoções dos pais e manipulam informações científicas para gerar vendas às custas da saúde e dos direitos de famílias, mulheres e crianças.
Os artigos abordam os seguintes pontos: como os comportamentos do bebê são mal interpretados para prejudicar a amamentação, cujos amplos benefícios para a saúde podem ser protegidos por intervenções multissetoriais; como o marketing de fórmula visa cuidadores, profissionais de saúde e políticos e prejudica a saúde e os direitos de crianças e mães; e como os desequilíbrios de poder e as estruturas políticas e econômicas determinam as práticas de alimentação, os direitos das mulheres e os resultados de saúde.
Os dados apresentados pelos artigos indicam que a comercialização de leites artificiais para crianças tem aumentado rapidamente nos últimos vinte anos, movimentando atualmente 55 bilhões de dólares por ano. Deste valor, entre 2,6 e 3,5 bilhões de dólares são investidos em marketing e propaganda.
A série aborda como o marketing das fórmulas lácteas se beneficia da falta de proteção, incentivo e suporte ao aleitamento para manipular informações científicas, explorar emoções dos cuidadores e gerar vendas. Os autores descrevem casos de influenciadores pagos pela indústria, que compartilham as dificuldades da amamentação como introdução à propaganda das fórmulas.
Os anúncios e rótulos dos produtos afirmam que fórmulas especializadas reduzem a agitação, aliviam cólicas, prolongam o sono à noite e estimulam níveis elevados de inteligência, embora não haja comprovação científica de qualquer uma destas afirmações. Tal estratégia de marketing viola o Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno, que diz que os rótulos não devem idealizar o uso da fórmula.
Ademais, as mulheres enfrentam falta de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno dentro dos sistemas de saúde devido à escassez de investimento governamental, frequente falta de apoio qualificado por parte dos profissionais de saúde e ausência de cuidados voltados às necessidades específicas das mulheres, de acordo com sua cultura. Atualmente, segundo os responsáveis pela série, cerca de 650 milhões de mulheres carecem de proteção adequada à maternidade.
Segundo os autores, os níveis de aleitamento materno melhoram quando os sistemas de saúde capacitam ativamente as mulheres e permitem que pares experientes as apoiem durante a gravidez, o parto e o puerpério. Eles reiteram que o aleitamento materno é responsabilidade coletiva e fazem um apelo por ações de promoção, apoio e proteção mais eficazes, incluindo a disponibilidade de equipes de saúde mais capacitadas e o estabelecimento de um tratado jurídico internacional para proibir o lobby político e o marketing abusivo das fórmulas infantis.
O editorial sobre o artigo publicado no The Lancet afirma: “Algumas mulheres não conseguem amamentar ou escolhem não o fazer. A pressão percebida, ou a dificuldade, para amamentar – especialmente se estiver em desacordo com os desejos da mãe – pode ter um efeito prejudicial na saúde mental materna, e os sistemas devem funcionar para dar suporte às mães e suas escolhas. Mulheres e famílias tomam decisões sobre alimentação infantil com base nas informações que recebem, e uma crítica às práticas de marketing predatório não deve ser interpretada como uma crítica às mulheres. Todas as informações que as famílias recebem sobre alimentação infantil devem ser precisas e independentes da influência da indústria para garantir uma tomada de decisão consciente”.
Referência:
Breastfeeding 2023: Series from The Lancet journals. Publicado em 7 de fevereiro de 2023. Disponível em https://www.thelancet.com/series/breastfeeding-2023
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