Dra. Roberta Fittipaldi é médica pneumologista, pesquisadora em ventilação mecânica, que trabalha nas principais UTIs da cidade de São Paulo e é professora da curso Ventilação Mecânica Online na Academia Médica.
A metacognição é definida pelo processo de "pensar sobre o pensamento", em outras palavras, é o processo que reflete hábitos pessoais, construção do conhecimento e caminhos para o aprendizado. Inicialmente proposta pelos psicólogos Willian James, Jean Piaget e Lev Vygotsky nos anos 70, hoje, após várias pesquisas, podemos aplicar conceitos de metacognição no ensino moderno, no qual é possível utilizar a metacognição como um processo que direciona o aluno ao seu próprio aprendizado e auto-conhecimento. (Ambrose et al, 2010).
Segundo Pintrrich: "existe uma necessidade de ensinar a metacognição explicitamente nas universidades, porque nós somos continuamente surpreendidos com o número de estudantes que chegam as universidades apresentando pouco ou nenhum conhecimento em metacognição, sobre diferentes estratégias, diferentes características cognitivas e nenhum conhecimento sobre si mesmo".
A proposta da metacognição em "aprender a pensar" e "pensar para aprender" vem baseada em estudos que avaliaram o sistema regulatório cerebral e concluíram que utilizamos esses sistemas para entender e controlar nossas próprias capacidades cognitivas.
Segundo os estudos, existem processos em torno de aprender a aprender. Na maioria das vezes, os estudantes (crianças e adultos) e instrutores desconhecem o que são e o que é necessário para melhorá-los. Esses processos consistem em:
1. Conhecimento de Cognição :
- a. Consciência de fatores que influenciam sua própria aprendizagem.
- b. Conhecer estratégias para usar para aprender.
- c. Escolher a estratégia apropriada para a situação específica de aprendizagem.
2. Regulamento de Cognição
- a. Definir metas e planejamento.
- b. Monitorar e controlar a aprendizagem.
- c. Avaliar o próprio regulamento (avaliando se a estratégia que você está usando está funcionando ou não, fazendo ajustes e tentando algo novo).
Através desse conhecimento, surgiram propostas de questionários e avaliações que procuram objetivar e quantificar o processo de metacognição no aprendizado.
Em 1994, Schraw e Dennison criaram o Inventário de Consciência Metacognitiva – Metacognitive Awareeness Inventoty (MAI), especificamente para que os adultos aprendessem a consciência do conhecimento metacognitivo e da regulação metacognitiva. O MAI consiste em 52 questões que avaliam esses dois componentes, através de perguntas em que o aluno responde como verdadeiro ou falso itens relacionados a sua forma de encarar um problema, de priorizar certas informações, e sobre como organiza uma estrutura de aprendizado.
Na conclusão das pesquisas de Schraw e Dennison foi visto que havia forte associação para ambos os fatores de metacognição realizando esse questionário e que eles também estavam relacionados.
Pesquisas mais recentes revelaram uma correlação significativa entre o MAI e algumas medidas de desempenho acadêmico (passar em uma disciplina, notas de fim de curso etc.). No entanto, ao observar estudantes de graduação e pós-graduação (adultos, jovens e idosos), descobriu-se que não diferem em suas pontuações médias nas áreas de Conhecimento de Cognição (semelhantes para ambos os grupos), mas diferem em termos de suas estratégias e habilidades de regulação.
O Conhecimento da Cognição é mais facilmente adquirido e melhorado. As estratégias de Regulamentação de Cognição não são tão fáceis de adquirir e, na maioria das vezes, os alunos não melhoram com o tempo em suas pontuações de Regulamentação – porque precisam aprender as estratégias e ter chances de praticar experiências de sala de aula. Sendo assim, os estudos concluem que alunos precisam que seus instrutores mudem o mindset para avaliar a metacognição para ajudá-los a construir suas próprias estratégias em torno da regulamentação da aprendizagem ao longo de uma trajetória de aprendizado.
Em tempos nos quais o universitário aprende superficialmente e retém pouco conhecimento para a aplicabilidade prática, e nos quais escolas médicas focam no aprender aqui e agora, faz-se necessário uma reavaliação do processo de aprendizado. Nosso paradigma atual não prepara o aluno para uma carreira médica duradoura e para uma vida médica. Alguns pesquisadores defendem a incorporação do ensino baseado na prática como um dos fatores para a melhoria do ensino médico, mas sabemos que infelizmente nosso país ainda patina em erros e acertos acerca desse sistema de aprendizado e avaliação. É necessário trazer o aluno para a prática do mundo real, estimular o pensamento crítico e intuitivo que tanto se faz necessário para médicos atualmente. A aplicação de metodologias baseadas em prática clínica, na resolução de problemas e na metacognição que faça o aluno ser estimulado e motivado a pensar não só no processo de definição diagnóstica, mas em todo o caminho no qual ele conseguiu chegar lá é uma proposta que trará conhecimento e aprendizado a longo prazo.
Sabemos que existem inúmeras limitações para aplicação dessas técnicas: tempo, recursos, dificuldades entre professores e do próprio aluno. Porém todo o processo só muda quando conseguimos pensar criticamente e reavaliarmos seus pontos nevrálgicos. Dessa forma, utilizando a metacognição como avaliadora e promotora de mudanças, sem dúvida é possível trazer benefícios para nossos alunos e também para instituições.
Referências:
- Metacognition in medical education – Keys to developing expertise mark quirk
- Ten metacognitve teaching strategies – Centre for Innovation and Excellence in Learing . Liesel knaack and Melissa Robertson
- Metacognition handout - stanford university.edu
Leia também os outros artigos da série sobre Ensino Médico, publicado pela Dra. Roberta Fittipaldi.
- A neurociência como aliada ao ensino médico
- O efeito "Times Square" e como ele pode afetar a memória e o aprendizado
- Aprendizado e leitura em tempos de Google
- Motivação como substrato para o ensino médico
Curso de Ventilação Mecânica Online com Dra. Roberta Fittipaldi
Roberta Fittipaldi é colaboradora da Academia Médica e professora do curso Ventilação Mecânica Online, uma um curso para se manter atualizado e ainda aprender de vez Ventilação Mecânica, com o intuito de melhorar a qualidade e segurança do paciente, intensivo ou não, que necessita de suporte ventilatório.
É também doutora em Ventilação Mecânica pela FMUSP, especialista em Educação Medica pela Harvard TH Chan e médica das UTIs respiratórias do HIAE e Incor.
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