A doxiciclina, com seu amplo espectro e custo-benefício, mostra-se promissora como profilático, especialmente para HSH e mulheres transgênero, apesar das preocupações sobre resistência antimicrobiana.
O cenário atual das infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) é alarmante, marcado pela ocorrência diária de mais de um milhão de ISTs tratáveis em todo o mundo. As consequências dessas infecções vão muito além dos sintomas imediatos. Sífilis, por exemplo, pode levar a meningite, surdez, cegueira e ainda a graves sequelas congênitas, incluindo natimortos e morte neonatal. A clamídia e a gonorreia não ficam atrás em gravidade, estando associadas à infertilidade.
Por mais que haja antibióticos acessíveis e eficazes, a prevenção de ISTs apresenta vários obstáculos. Um desafio notório é a alta prevalência de infecções assintomáticas, especialmente entre aqueles com menor literacia em saúde e acesso restrito a cuidados médicos, frequentemente devido ao estigma associado a ISTs.
Em busca de soluções inovadoras, tem-se estudado o potencial profilático da doxiciclina, um antibiótico de amplo espectro, de fácil absorção e custo-benefício atrativo. A inspiração veio dos antirretrovirais, usados há décadas na profilaxia pós-exposição ao HIV.
Pesquisas recentes revelaram os promissores efeitos da doxiciclina. Um ensaio clínico realizado na França com homens que fazem sexo com homens (HSH) evidenciou que uma dose única de 200 mg do medicamento, administrada até 24 horas após relações sexuais desprotegidas, teve considerável impacto na redução das ISTs. No contexto norte-americano, estudos com HSH e mulheres transgênero reforçaram essa constatação, apresentando resultados consistentes na diminuição da incidência de ISTs.
Para uma visão detalhada e compreensiva sobre o tema, apresentamos a seguir a tabela que consolida os resultados dos ensaios clínicos randomizados referentes à Profilaxia Pós-Exposição com Doxiciclina (doxyPEP) no combate às Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) bacterianas:
Fonte: JAMA Insights. doi:10.1001/jama.2023.16416
Em termos de segurança, a doxiciclina provou ser bem tolerada na maioria dos casos. No entanto, há efeitos colaterais possíveis, como diarreia, queimadura solar e náusea. Nesse sentido, é crucial que os pacientes sejam aconselhados a minimizar a exposição solar durante o tratamento.
No entanto, a utilização crônica e episódica de antibióticos suscita preocupações sobre a resistência antimicrobiana. Notadamente, o estudo norte-americano indicou uma resistência mais elevada à tetraciclina entre os usuários de doxiciclina.
Considerando a preocupante epidemia de ISTs bacterianas, a eficácia comprovada da Profilaxia Pós-Exposição com Doxiciclina (doxyPEP) e os contínuos desafios de prevenção, integrar a doxiciclina às estratégias de prevenção, particularmente para HSH e mulheres transgênero, é uma opção a ser seriamente ponderada. Acompanhando de perto os índices de resistência antimicrobiana e aplicando a medicação de forma informada e criteriosa, a doxiciclina pode representar uma ferramenta adicional e fundamental na prevenção das ISTs.
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Referência:
Mayer KH, Traeger M, Marcus JL. Doxycycline Postexposure Prophylaxis and Sexually Transmitted Infections. JAMA. 2023;330(14):1381–1382. doi:10.1001/jama.2023.16416