O mês de setembro é destinado ao combate ao suicídio. Linda, legítima e necessária campanha. Entretanto, questiono: será que é suficiente?
O suicídio é apenas a ponta do iceberg, o suprassumo do sofrimento, a perda completa das esperanças, a ausência de luz no fim do túnel. Diria, até, que uma última atitude de coragem de alguém que já não suporta mais, seja qual for a sua luta interior ou angústia. Mas veja bem, em sã consciência, quem de nós gostaria verdadeiramente de se desfazer do dom da vida? Acho que ninguém. Todos desejamos usufruir das alegrias de estar vivo. E são tantas, não é mesmo? Então, questiono: por quais motivos alguém apertaria o gatilho, saltaria de um prédio ou tomaria três cartelas de psicotrópicos?
Penso que há algo tão mais complexo, interno e profundo que rodeia uma mente suicida, que apenas gritarmos em propagandas que “esta não é a melhor saída”, nem de longe adianta. É preciso muito mais. É preciso mergulhar na nossa humanidade e perceber que necessitamos, o ano todo, de mais compaixão, de mais solidariedade, de mais complacência, de mais empatia, de mais amor… e eu poderia citar uma infinidade de virtudes que mesmo que procuremos atentamente, já não vemos mais num mundo que apenas valoriza o EU. E nessa valorização exagerada de si, não sobra espaço e nem tempo para o outro. Nem pra si mesmo, na verdade.
Vivemos numa sociedade de telas, de entretenimento infinito. De relações rasas e diálogos restritos a figurinhas. “Gargalhamos” com emoticons sem esboçarmos sequer um sorriso na realidade. Dialogamos sobre Big Brother ou qualquer tipo de passatempo vazio, mas não conversamos sobre questões essenciais para edificação do ser humano. Afinal, é chato, é massante, é “cringe”. Vivemos na plateia da comparação. Na busca incessante por patamares irreais, que, quanto mais tentamos subir para alcançá-los, mais cavamos a nossa própria cova de inferioridade, de não aceitação, de autodesvalorização e de pouca autoestima. Nos sabotamos a toda hora e estimamos, na verdade, o outro. Que, por sua vez, estima o outro, num efeito dominó contínuo, doente e com reflexos inimagináveis. Com reflexos que não paramos para pensar.
Na era do TER não sobra espaço para SER.
Ser de verdade, ser você mesmo. Seguimos um padrão, somos levados pela manada, estereotipados e nos enganando achando que estamos escolhendo algo. Estamos todos adoecidos, e engana-se quem pensa que não.
Será que falar é a saída? Falar pra quem? Quem, de verdade, consegue parar pra entender sem julgar? Quem abraça a dor do outro? Quem acolhe nossas frustrações, angústias e sentimentos? Quem está preocupado genuinamente com o colega ao lado?
É tão simples digitar “conte comigo” pelo celular. Mas na nossa vida apressada, ansiosa e corrida, ninguém tem tempo para ouvir. Pelo contrário, hoje aceleramos até o áudio do WhatsApp, pois não temos mais paciência para escutar na velocidade real o que alguém tem a dizer, por mais banal que seja, imagine um pedido velado de socorro.
É, meus amigos, talvez destinar um mês de campanha seja pouco. Talvez seja necessário repensar o caminho que estamos percorrendo enquanto sociedade, e revolucionarmos a nossa própria humanidade de tal forma que resgatemos valores morais, intelectuais e até mesmo sociais para que tenhamos o poder de reflexão, sem que sejamos apenas uma massa de manobra.
Talvez nós mesmos precisemos de ajuda, para, então, salvarmos os outros.
Falar sobre suicídio jamais terá impacto enquanto for apenas marketing. Enquanto for apenas em telas. Enquanto for da boca pra fora.
Necessitamos, urgentemente, de relações humanas verdadeiras.
Necessitamos de responsabilidade com o próximo.
Necessitamos nos conhecermos de tal forma que estejamos prontos e abertos pra entendermos o outro.
Necessitamos parar.
Necessitamos pensar.
Necessitamos, então, refletir.
Só com reflexão, conseguiremos chegar às respostas que as mídias não nos dão.
Então, mais uma vez, repito o questionamento: será que só a campanha é suficiente?
Talvez, a resposta esteja no próprio nome. Amar é o elo. Amarelo.
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