As doenças cardiovasculares (DCV) são a principal causa de
morte na maioria dos países de baixa e média renda (PBMRs), como o Brasil.
Agora, um grupo de
pesquisadores brasileiros buscou avaliar o impacto de fatores de riscos
cardiovasculares já conhecidos (como hiperglicemia, dislipidemia, obesidade,
hipertensão e tabagismo) na mortalidade por DCV. Os resultados do estudo foram
publicados na revista PLOS ONE.
Foram
usados dados de fontes governamentais, como os ministérios do Desenvolvimento
Social e da Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
registrados entre 2005 e 2017, totalizando 312
observações estado/ano. Os números foram confrontados com
informações de outros bancos de dados, como o Global Health Data Exchange (GHDx) e o repositório do Institute for Health Metrics and Evaluation
(IHME), da Universidade de Washington, nos Estados Unidos.
As principais variáveis dependentes utilizadas ao longo do
estudo foram as taxas de mortalidade ou incidência por 100 mil indivíduos por
DCV, cardiopatia isquêmica ou acidente vascular cerebral isquêmico por sexo,
estado e ano. Uma análise de sensibilidade empregou os anos de vida
perdidos devido à mortalidade prematura (YLL, calculado para cada morte por
causa específica em relação à expectativa de vida padrão normativa na idade da
morte) em vez das taxas de mortalidade. Modelos de regressão linear
multivariada de efeitos fixos foram realizados, ajustando para renda,
desigualdade de renda, pobreza e acesso à saúde.
Entre 2005 e 2017, as mortes por DCV diminuíram 21,42%, acompanhadas
por uma diminuição expressiva do tabagismo (-33%) e aumento da hiperglicemia
(+9,5%), obesidade (+31%) e dislipidemia (+5,2). A hiperglicemia mostrou uma associação
com esse desfecho de cinco a dez vezes maior do que outros fatores, especialmente em mulheres. É importante ressaltar
que a associação entre hiperglicemia e mortalidade por DCV foi independente do
nível socioeconômico e de acesso aos cuidados de saúde.
Além
da redução do tabagismo, o maior acesso à saúde básica é listado como um dos
fatores responsáveis pela melhora nos índices de mortalidade por doenças
cardiovasculares. Essa observação levou em conta a questão da hipertensão,
frequentemente associada a problemas cardíacos. No entanto, ela representou
sete vezes menos mortes por doenças cardiovasculares do que a hiperglicemia.
Uma das possibilidades é que o acesso ao sistema de saúde universal, com
aumento na cobertura de atenção primária, que tornou melhor a taxa de controle
da pressão arterial na população.
Um
aspecto que chamou a atenção dos pesquisadores foram as diferenças observadas
nos resultados de acordo com o gênero: “As disparidades sexuais reiteram outros
estudos que apontam o diabetes e a hiperglicemia como fatores de risco mais
fortes para doença cardiovascular em mulheres do que em homens”,
advertem.
Os
pesquisadores concluíram que cerca de 5 mil pessoas não teriam morrido por
doença cardiovascular no período analisado caso os índices de diabetes fossem menores
na população. Por outro lado, a pesquisa também permitiu concluir que pelo
menos 17 mil mortes foram evitadas somente pela diminuição do consumo de
cigarros durante esses 12 anos.
As políticas de saúde, de acordo com os cientistas, devem ter
como objetivo reduzir diretamente a prevalência de hiperglicemia para mitigar a
carga populacional de DCV no Brasil no futuro, seja por meio de uma melhor educação
nutricional da população, pela restrição a alimentos com açúcar adicionado ou
pelo acesso a novas classes de medicamentos hipoglicemiantes.
Referências:
Gaspar
RS, Rezende LFM, Laurindo FRM. Analysing the impact of modifiable risk factors
on cardiovascular disease mortality in Brazil. PLoS One. 2022 Jun
22;17(6):e0269549. doi: 10.1371/journal.pone.0269549. PMID: 35731729; PMCID:
PMC9216570. Disponível em https://journals.plos.org/